Duas casas emblemáticas – por Marcus Prado.

AS MUITAS CASAS, dentro e fora do Brasil, que deixaram na minha memória generosas recordações, serão vistas no meu livro, em fase final de releitura crítica e revisão: “O Tigre Anfíbio”, iniciado há mais dez anos. A primeira forte lembrança que descrevo, entre outras para mim enriquecedoras, foi ao conhecer a cabana de Martin Heidegger, na Floresta Negra (Alemanha). Fica numa aldeia chamada Todtnauberg, no município de Todtnau, região de Baden-Württemberg. A poucos quilômetros, fica a cidade de Freiburg, onde Heidegger lecionava.  Foi nessa cabana, numa paisagem bucólica e fria, sem o conforto que o filósofo mundialmente conhecido havia deixado na sua Friburgo, que ele todas as noites acendia uma fogueira e, ao redor da chama  e do seu calor, se reunia longamente com os camponeses e lenhadores da Floresta. A lenha era colhida na mata, um trabalho um tanto cansativo para Heidegger. Era extraída das chamadas árvores perenes como nogueira, carvalho, bordo, cedro e amieiro. Escolhidas porque produziam muito calor e rendiam mais. O curioso é que, segundo seus biógrafos, não havia quase nada a conversar, ficavam em silêncio, esses vultos e suas aparências alegóricas. Uma provável comunhão coletiva da vida com o fogo, sua mística, sua magia, uma talvez reflexão sobre a existência, tão saliente no universo de Gaston Bachelard. A luz imaginária partindo de uma simples fogueira, essa luz nascida em nosso ser. A seus olhos, o pensamento mais claro tinha um camponês que nada sabia de filosofia. A cabana era uma constante companheira no diálogo do mestre alemão consigo mesmo. A permanente silhueta da cabana na neblina, em meio aos robustos pés de árvores centenárias.  Sabe-se que foi nessa cabana, numa simplicidade rude e campestre, ao seu lado, a mulher, Elfriede, que ele iria construir a essência de sua filosofia e o seu modo de ver o mundo, o ser e nossa dimensão de existencialidade. Nessa cabana, Heidegger pensou o espaço a partir de sua vinculação ontológica com a noção de lugar, o processo incessante de auto-compreensão da existência que predominaria no seu agir filosófico:  demonstrar o tempo como horizonte de compreensão do ser.

OUTRA CASA, para mim, emblemática, na cidade colonial de Paraty (Rio de Janeiro), cercada pela pujança da mata de um lado e por outro as terras do Engenho Boa Vista, do séc. XVIII serviu de berço a Julia Bruhns da Silva, mãe de Thomas Mann, ganhador do Prêmio Nobel de Literatura de 1929 e Prémio Goethe em 1949, considerado um dos maiores romancistas do século XX. Contam que era hábito nesse sobrado o acender de uma fogueira, feita pela menina Julia, e, em torno dela, à guisa da luz de que ninguém se dava conta, ela nominava as gotas de orvalho sobre as flores do jardim.  Júlia foi a musa inspiradora das obras de Heinrich e Thomas: a personagem Gerda Arnoldsen em Buddenbrocks, a Senadora Rodde em Doutor Fausto, a Mãe Consuelo, em Tônio Kröger e, finalmente, a mãe de Gustav Von Aschenbach, principal protagonista de Morte em Veneza. Anatol Rosenfeld faz uma bela análise disso, dizendo que a mãe estaria no centro da vocação literária dos filhos. Ouvi dizer, quando estive nesse sobrado, recentemente, que vão instalar uma residência para escritores do mundo todo – este é o sonho de Nikolaus Gelpke, amigo da família Mann, sob o fascínio desse ambiente. Uma maravilha, inédita, em qualquer país.

 SEPARAR essas casas (lugares indistintos uns dos outros) é desconhecer a força da imaginação e dos devaneios, o estado etéreo de que se revestem. Os elementos do Fogo e suas claridades nelas existentes.

Marcus Prado – Jornalista.

Momento Cultural: Lenda – por Corina de Holanda.

Contam que a Virgem Maria

Que é Deus a jardineira,

Planejou no céu, um dia,

Uma festa brasileira

Na celestial floreira

Já muitas flores havia…

Porém, a Virgem, queria

Por mais uma… E a maneira,

Foi dizer para os Arcanjos:

“Mandem à terra dois anjos.

Mas, quero flor sem espinho”.

Então dois Anjos desceram,

E entre os jasmins escolheram

E levaram – Socôrrinho.

1970

(Entre o Céu e a Terra – Corina de Holanda – pág. 44).

DOCE DE BANANA E PAU DE CANELA – por Sosígenes Bittencourt.

De manhãzinha, minha mãe manifesta o desejo de confeccionar um doce de banana. O doce é temperado com pau de canela. Aí, eu me apronto e vou comprá-lo no mercadinho do bairro. Tomo banho, boto perfume, costume antigo. Empertigado, decidido, vou desfilando pelas calçadas, narrando, em solilóquio, tudo que faço.

– Bom dia. Tem pau de canela?

O funcionário vai na frente e eu vou atrás, percorrendo o corredor de gôndolas.

– Quanto é o saquinho?

– Oitenta centavos, professor.

– Dê-me dois. (Relembrando que não se inicia frase com pronome oblíquo)
Dirijo-me ao balcão de frios e pergunto a um determinado cidadão: – O nome disso é pau de canela ou canela em pau?

Risadagem geral.

No momento da manufatura desta narração, o doce já está pronto, e a casa incendiada do aroma da guloseima, poética de ternura.

Feliz de quem pode desfrutar do tempo para escrever ou saborear uma leitura no mundo tão amargo e sem ternura que estamos vivendo.

Adocicado abraço!

Sosígenes Bittencourt

Roberto e Wanderléa – Moisés e Flávia – uma viagem no tempo!!

Flagrados pelas nossas lentes, no último domingo (04), no Pátio da Matriz, a dupla, inevitavelmente, fez  os mais “maduros”, que estavam em sua volta,  viajar  no tempo para recordar uma outra dupla que fez muito sucesso no movimento musical que ficou  muito conhecido como “Jovem Guarda”.

Ao bom estilo, por assim dizer, e como muitas histórias para contar, desde os tempos de jovens, a dupla amiga – Flávia e Moisés – foi buscar no fundo do baú uma canção do Rei Roberto Carlos – parecendo Roberto e Wanderléa. A música, entre tantos, tem o poder de nos transportar para qualquer lugar ou tempo, sem que necessário  tirarmos os pés do lugar!!! Veja o vídeo.

Demóstenes de Olinda d’Almeida Cavalcanti – por Pedro Ferrer.

No dia 20 de setembro de 1873, a senhora Edeltrudes de Holanda Cavalcanti d´Almeida deu à luz uma criança do sexo masculino. O pai, major Claudino José de Almeida Lisboa, pôs-lhe o nome de Demóstenes de Olinda. Vitória de Santo Antão ganhava um poeta e escritor. Concluído seu curso primário, partiu, em 1886, para o Recife na tentativa de realizar um ideal acalentado desde a mais tenra idade, bacharelasse em Ciências Jurídicas. Matriculou-se no Ginásio Pernambucano. Disciplinado em tudo: no acordar, no vestir e no estudar, logrou grande êxito nos estudos, sendo um destaque em classe. Nos horários extraclasses criou com alguns colegas um pequeno jornal, “O Literário”. Terminado o “Curso de Humanidades” ingressou na Faculdade de Direito do Recife. Ainda estudante das ciências jurídicas, colaborou com diversos jornais da capital escrevendo artigos, crônicas, contos e poesias. Em dezembro de 1895 recebeu seu diploma de bacharel em Direito indo trabalhar na diretoria da “Instrução Pública” e de “Melhoramento do Porto do Recife”. Seu único livro publicado, “Ortivos”¹, em 1894, ainda estudante, não teve a devida divulgação mas é carregado em sentimentos. “Pelos seus versos sente-se que o seu cantar era o amor, a felicidade, o sonho, a alegria de viver, e só raramente cantava a dor, o sofrimento” (Júlio Siqueira).

Em 1897 foi nomeado promotor público da comarca do Alto Rio Doce, Minas Gerais. Seu bom desempenho mereceu-lhe uma rápida promoção, juiz da cidade de Patrocínio, na mesma Alterosa. Não teve tempo de assumir o novo cargo. No dia 15 de agosto de 1900 faleceu, deixando viúva a senhora Augusta Olinda de Almeida Cavalcanti. Não tiveram filhos.

Além do seu livro “Ortivos”, único editado e publicado, deixou inúmeras poesias avulsas, dispersas tanto em Pernambuco, como no Rio de Janeiro e em Queluz, cidade mineira onde faleceu.

Em 26 de janeiro de 1901 um grupo de escritores pernambucanos, liderados por Carneiro Vilela, criaram a Academia Pernambucana de Letras, tendo o nome de Demóstenes sido indicado para Patrono da Cadeira, nº 20. Era o mais alto reconhecimento do mérito literário daquele que tão cedo partira para a eternidade. Esse reconhecimento se estendeu e se manifestou ainda com a publicação de sua biografia no Dicionário Corográfico, Histórico e Estatístico de Pernambuco e no Almanaque de Pernambuco. Foi ainda homenageado na capital pernambucana com a aposição do seu nome em uma rua do bairro da Madalena. Semelhante reverência recebeu da prefeitura de Camaragibe que deu seu nome a uma rua em Aldeia. Vitória de Santo Antão também soube reverenciar a memória do seu ilustre filho, colocando seu nome em uma rua no bairro do Cajá.

.NOTURNO

Sonhei ( ai se eu assim sempre sonhasse:)

Que, reclinada, tinha-te ao meu lado,

e te beijava a loira fronte, a face

rubra e o rubro seio perfumado.

Que esse meu sonho azel sempre durasse:

que de leve não fosse perturbado

o sono meu: que nunca eu despertasse

senão na clara noite do noivado

Isto eu pedia aos céus ainda ouvindo

a doce prece dos teus lábios, quando

vou de repente as pálpebras abrindo…

Despertaste (dirás) verso cantando…

mas não: eu não te vendo ao lado, rindo,

só poderia despertar chorando!…

ESCURO TEMA

Cada vez que te falo me convenço

que melhor fora se te não falasse,

porque se em ti eu tanto não pensasse,

não te falava do que menos penso.

E digo mesmo que este amor intenso

que guardo n’alma, eu antes não guardasse,

pois dos loucos, se assim eu não te amasse,

não pertencia ao número e pertenço.

Longe de mim não és feliz, ausente

de ti não sou feliz: mas os desejos

que temos se resumem num somente.

Ah! Não termos do pássaro os adejos

para estares comigo eternamente

e eternamente eu te cobrir de beijos!

ORTIVOS¹ – VERSOS

Hugo & Cia – Editores

Papelaria Americana

Recife – 1894

1 – Ortivo = nascente, que está nascendo, oriental.

Pedro Ferrer – presidente do Instituto Histórico da Vitória. 

Momento Cultural: OLHOS BIZARROS – por Teixeira de Albuquerque.

Olhos de feiticeira, olhos de graça,
olhos encomendados no Japão,
olhos de grilo, de mulher brejeira,
olhos de luz, de sombra, de ilusão.

Olhos de sol, de sol ou de fogueira?
olhos de rosa, de interrogação
olhos de urtiga, olhos de laranjeira,
olhos de queimar cheios de emoção.

Os meus sonhos, em vós, cantam a Gueixa
e pensam em compor uma sonata
cheia de amor, de idílios e de queixa

De vossa dona que é a vossa nata,
– deixa-me repousar um pouco, deixa,
à sombra dessa, pálpebra que mata.

“O LIDADOR” 29.V.1926

José Teixeira de Albuquerque, nasceu na fazenda Porteiras, Vitória de Santo Antão aos 23 de agosto de 1892. Seus pais: Luiz Antonio de Albuquerque e Dontila Teixeira de Albuquerque. Estudou medicina na Faculdade da Bahia, porém desistiu do estudo no 3º ano. Casou em segundas núpcias com a conterrânea Marta de Holanda, também poetisa e escritora. Publicou o livro de versos MINHA CASTÁLIA e colaborou em várias revistas e jornais; tanto da Vitória como do Recife. Foi funcionário do Arquivo da Diretoria das Obras Públicas do Estado,com competência e zelo. Faleceu no Recife, no dia 2 de outubro de 1948. Não deixou filhos. Sua morte foi muito sentida entre os intelectuais, que não se cansaram de elogiar sua prosa e seus versos.

TRANSPARÊNCIA E ÉTICA SEM MISTIFICAÇÃO – por Sosígenes Bittencourt.

NA SUÉCIA, JUÍZES E POLÍTICOS SÃO “CIDADÃOS COMUNS”

“A transparência nos atos judiciais do poder.” Esta é a teoria e a prática para a democracia sem arrogância, sem mentira, sem ditadura enrustida. Esta é uma ética moral, aquilo que foi ensinado e, exemplarmente, aprendido, sem mistificação.

As pessoas estão embevecidas com a LIBERDADE que pensam ter, sem a SEGURANÇA que precisavam ter. Liberdade sem segurança é loucura. (Freedom without security is madness).

Sosígenes Bittencourt

Para comemorar o dia 3 de agosto, Corriola da Matriz levantou “acampamento” no Monte das Tabocas.

No intuito de celebrar a vida e as boas amizades o grupo intitulado “Corriola da Matriz” promoveu mais uma “Missão Cultural”. Aproveitando o feriado das comemorações alusivas aos 374 anos da Batalha das Tabocas, o grupo “acampou” no Monte das Tabocas.

Por lá, além do clima comemorativo e sobejo “comes e bebes”, o professor narrou, com riqueza de detalhes, os passos dos holandeses, oriundos do Sítio Covas – São Lourenço da Mata – na tentativa de sufocar os lusos brasileiros. Nesse contesto, contudo, o professor relembrou o viés religioso na refrega.

Na ocasião, o Monsenhor Maurício Diniz, pároco da Matriz de Santo Antão e celebrante da missa campal no referido sitio histórico, na ocasião, marcou presença no “acampamento”. Ao final da brincadeira, por uma questão de sequência histórica, em setembro, o grupo seguirá até o Monte dos Guararapes, local não menos importante na chamada Restauração Pernambucana.

Instituto Histórico comemorou os 374 anos da Batalha das Tabocas.

Na noite da sexta (02) o Instituto Histórico e Geográfico da Vitória abriu as porta do Salão Nobre para comemorara a passagem dos 374 anos épica Batalha das Tabocas, ocorrida em nosso solo no dia 03 de agosto de 1645. Na pauta da solenidade: palestra e tomada de posse de novos sócios.

Na qualidade de sócio correspondente, tomou posso o sargento Paiva (instrutor do nosso Tiro de Guerra). O repórter José Sebastian e o deputado Henrique Filho – sócio efetivo.

Natural da nossa Vitória de Santo Antão, o professor Catedrático da UFPE, Luiz Bezerra de Carvalho, na sua explanação, mergulhou de corpo e alma no oceano de lembranças da sua “viva” e intacta memória. Como bom antonense, mesmo morando fora da terra natal, há décadas,  com passagem inclusive por outros países demonstrou nunca haver se desligado das suas raízes. “Lembrou de tudo e de todos,  com humor e sentimento”.

Ao final do evento solene, os presentes foram convidados pelo professor Pedro Ferrer – presidente do Instituto – a  participaram de um coquetel nas dependências da Casa do Imperador.

LEMBRANÇAS do Ginásio 3 de Agosto – por Marcus Prado.

ALEGRA-ME a notícia, divulgada neste Blog de Pilako, do restauro do prédio centenário do Ginásio 3 de Agosto. Uma boa ação do prefeito. Quando estive nesse colégio, há cerca de um ano, para rever a sala dos meus tempos de ginasiano, saí de lá indignado com a situação de abandono e carências, uma herança nefasta de ex-prefeitos omissos. Felizmente, foi restaurado. Veio-me à lembrança os meus queridos professores: Daury da Silveira Santos, Carlos Palmeira Valença, Padre João Tavares, Amaury Teixeira Nunes, Terezinha Beltrão, Ubiratan Carneiro da Cunha. Poucos sabem, mas um dos seus professores mais dedicados foi o saudoso  industrial vitoriense Elmo Cândido Carneiro. 

Foi das mãos de Amaury Teixeira Nunes, lembro-me como se fosse nesta hora, (eu tinha 17 anos) que recebi um livro que iria mudar  mais tarde o meu destino profissional: VIDA LITERÁRIA, de Rosário Fusco. Amaury morava no Ginásio, no terceiro andar, um ambiente cercado por centenas de livros, a sua paixão por toda vida.Foi dele que recebi os primeiros incentivos para o ofício de jornalista. 

 
Anos depois, nos encontramos, Daury e eu, o grande mestre e o ex-aluno,  quando, na condição de colunista e editor com César Leal, do suplemento literário do DIÁRIO DE PERNAMBUCO, tive a honra de publicar os seus artigos voltados para o mundo acadêmico.    
Marcus Prado – Jornalista