Momento Cultural: CANÇÃO ANTIGA – por Henrique de Holanda.

Eu te amei tanto…
foste meu tudo:
– um lírio da Judéia
que teceu de perfume um manto
e, bem de leve, de mansinho, mudo,
vendou-me os olhos e envolveu-me a idéia…

E como um passarinho esvoaçante
sobre a minha existência outrora calma,
a mais linda canção tu me ensinaste
porque entraste, cantando, na minh’alma.

Resolveste fugir do meu destino.
Desviaste do meu, o teu caminho
e deixaste, num louco desatino,
meu triste coração sofrer sozinho…

Hoje és somente uma ave sem guarida;
o amargurado sonho que sonhei;
uma folha seca na haste da minha vida,
a cantiga mais triste que cantei…

Henrique de Holanda Cavalcanti, último filho do casal Joaquim-Olindina de Holanda Cavalcanti, nasceu na Vitória (de Santo Antão) aos 7 de março de 1909. Muitíssimo inteligente, desde criança demonstrava seus pendores intelectuais e escrevia pequenas crônicas e poesias para jornais locais. Poeta nato, escreveu muitos poemas, tendo publicado, em 1946 o livro NO BRASIL QUANDO ANOITECE. Faleceu aos 25 de novembro de 1947. Foi publicado, posteriormente, MUITAS ROSAS SOBRE O CHÃO dado o interesse do Prof. José Aragão.

Momento Cultural: SORRISO DE CRIANÇA – por ADJANE COSTA DUTRA.

Tão pequenino Netinho…
Teu sorriso terno de criança…
Alegremente acalentas doces travessuras,
de lá pra cá,
de cá pra lá.
Netinho tão pequenininho…
E de lá pra cá,
de cá pra lá.
A correr alegremente,
bateu cá na mesa.
Tão pequenininho Netinho,
com teu sorriso de criança.

(TAPETE CÓSMICO – ADJANE COSTA DUTRA – 1995 – pág. 21).

Momento Cultural: JÁ QUE TE FIZ SOFRER – por Heitor Luis Carneiro Acioli.

Que crueldade fiz a ti! É imperdoável o que te fiz. Mas “minha fada”, não me deixe! Prometo os sete mares velejar para pôr um fim naquilo que te faz sofrer. Se te fiz algo errado, perdão e volta pra mim! Vou até o fim do mundo pra me redimir contigo.

Se quiseres que eu extinga minha vida, farei sem problemas, afinal é o mínimo que posso fazer, já que te fiz sofrer.

(Meu jeito em versos e prosas – Heitor Luis Carneiro Acioli – pág. 03).

Momento Cultural: O PRIMEIRO POETA – por Adão Barnabé.

O sol nasceu, brilhou por todo o mundo,
(quarto dia feliz da Criação),
do pináculo da terra ao vale imundo,
iluminou a Santa Geração…

e Deus criou Adão no sexto dia
mas, desgraça tão grande, azar profundo…
era tarde, o sol já ia se escondia,
acordou, bocejando, o vagabundo…

e quedou aterrado, soluçando,
sabendo que o Senhor… e bem sabia
estivera sua incúria observando.

Nem por isso ficou desesperado…
tinha a Lua, a Mulher e bem podia
ser poeta… e o foi muito inspirado.

(do arquivo da família)

Adão Barnabé

Momento Cultural (ESPECIAL): UM VULTO DE MULHER (poesia) – Por DILSON LIRA.

 

Se tens n’alma recôndita amargura,
que te acorrenta aos grilhões da dor,
incontinente foges do torpor
da tua vida tão vaga e escura.

Se tens do peito amargo sentimento,
de um desejo não realizado,
busca o futuro, esquece o teu passado,
que ameniza mais teu sofrimento.

Mas, se tens n’alma bem viva contigo
uma paixão, um vulto de mulher,
é bem difícil esquecê-la, amigo…

Alguém procura achar a solução,
e enquanto esquecê-la a alma quer,
mais amá-la procura o coração…

Dilson Lira

Momento Cultural: VATICÍNIO (poesia) – Por Valdinete Moura.

Se teu olhar brilhar como as estrelas,
E o coração pulsar desesperado,
Divinamente estás enamorado
E teu olhar terá mais que beleza.

Encontrarás refúgio encantado
Em um mundo de luz e profundeza
Plenificado em paz e sutileza
No aconchegado abraço da amada.

Terás, então, teu canto mais sublime
Mais harmonia e cor em teu sentir,
Alento que te guie e ilumine.

Se falta forças em hora desgarrada
E mesmo se a dor te consumir
Seja porto seguro tua amada.

Valdinete Moura é escritora,
membro da Academia Vitoriense de Letras, Artes e Ciência

Momento Cultural: Ao meu encontro – por João do Livramento.

 

Quem me busca de verdade

Vai me achar na caridade,

Pois afirmo com certeza

Me apresento na pobreza.

Se um doente é acolhido

Podes crer que fui servido,

E jamais vou esquecer

De quem me veio socorrer.

Se desejas me encontrar

Nos asilos vem me achar,

Mas quem pode acreditar

Que estou neste lugar?

Se sou faminto na criança

Não cobiço tua herança,

O alimento é o que te peço

Serve ao rei do universo.

A oração é importante

E a caridade relevante,

Unindo as duas com amor

Encontrarás teu criador.

 João do Livramento

Momento Cultural: Ser Filha de Maria – por Corina de Holanda.

Ser “Filha de Maria” é ser na terra,
Quase aquilo que os anjos são no céu;
Viver do amor que só pureza encerra
Contemplando a Jesus quase sem véu…

Ser d’Ele irmã, viver ao lado seu
Na intimidade que o pavor desterra;
Dizer: Meu bom Jesus, sois todo meu!
Ao pecado eu declaro guerra.

É possuir dos títulos o mais belo.
É ter, num traço azul, puro e singelo,
Fonte perene de eternal poesia…

Ser “Filha de Maria”, é tanta cousa
Sublime, tanta, que dizer não ousa,
Por ser bem pobre a minha fantasia.

(Entre o céu e a Terra – 1972 – Corina de Holanda – pág. 37).

Momento Cultural: Caridade – por Célio Meira.

Não te pergunte, Senhora,
como se faz caridade:
– venha ver a dor alheia,
nos recantos da cidade/

Repare bem o mendigo,
que se arrasta pelo chão,
é nosso irmão condenado,
nas grades da provação./

Veja crianças famintas,
e os olhos que não tem luz:
– seja irmã de Caridade,
na doutrina de Jesus./

(migalhas de poesias – Célio Meira – pág. 34).

Momento Cultural: Bem-te-vi morre! Vi-viu-tetéu? (poesia) – por Rildo de Deus.

Era uma vez um pássaro que nasceu nos tempos vindouros da humanidade
Quando ainda existia bicho desconfiado.

 

O pássaro cresceu e mostrou-se transformista
Teve cores de canário do império, galo de campina, patativa, craúna, azulão…
ROUXINOU, CABOCULINHO
Sabiá, joão-de-barro, periquita
Chegou a hora

 

Quis virar papagaio e capitão.

 

Levou uma pancada no juízo e desandou da evolução.
Bebeu veneno como elixir
O pássaro mítico girou no sol sem razão
Encontrou o mar Pânico
E não se tornou canCÃO

 

Agora é Bem-te-vi que maravilhas!
Tem a chave de onde mora
Também medo de arpão
Não sabe o caminho ao continente

 

Abre a janela pra luz entrar;
Fecha de noite
Assim tia coruja jamais chegará

 

Finalmente estufa o peito
jazigo perfeito
Pra morte murchar

 

Rildo de Deus é Escritor.

Momento Cultural: Caminhada Fugaz – por Luciene Freitas.

Cortando o céu, num clarão, a vida fugaz,
tal Via-láctea incandescente, bela,
no compasso pulsa. Efêmera luz que apraz!
Expande-se, pelo universo se esfacela…

 

Passa entre os astros e laços de ternura
em suaves voltas une almas, paralelas.
O amor em esplendor navega… à ventura
entre anjos. Crianças riem, serenas, singelas.

 

Corre a vida, corre contra o tempo,
marcando faces, machucando almas
na jornada fugaz, tal qual o vento,
entre megalegorias de estrelas… vagas.

 

Meditável tempo: estradas, veredas, ruelas…
onde há coroas de louros ou de espinhos.
Auroras, ocasos, dão matizes a aquarela
que se desenvolve na dureza dos caminhos.

 

Passa o Sol, a Lua, passam nuvens de carmim,
noite, dia. Vertigem! Tudo se acaba!
Céu ou inferno? Guiados por um Serafim
passamos, rumo ao tudo ou rumo ao nada.

 

ltos 
Certificado da Academia Petropolitana de Poesia Raul Leoni. Petrópolis / RJ. 19-10-2002.
 
 
Luciene Freitas é Escritora vitoriense, autora de dezenas de livros,
entre adultos e infantis.

Momento Cultural: NOTURNO DA PRAIA DOS MILAGRES – por José Tavares de Miranda.

Esses navios, que passam na noite,
são navios perdidos no além
são navios de piratas, marinheiro,
doudas fragatas que vão e que vêm.

 

São navios a vela
Bergantins, Brigues, Caravelas,
velozes, breves, fugazes,
perdidos para sempre sem roteiro.

 

Todos passam na amplidão do mar,
nessa noite escura de pressentimentos,
francamente alumiada por velhos candeeiros.

 

Lá vão os piratas heroicos,
os que mancharam de sangue as águas com seus alfanjes,
os loucos comandantes abandonados, sem remissão,
alucinados no meio das águas,
nessa noite de incrível escuridão,
a procura de marujos naufragados
noutras noites de abandono, sem perdão,
pedindo à Mãe dos Navegantes
o encontro de saudosos irmãos.
Esses navios que passam, marinheiro,
são navios perdidos na além;
são navios de esquecidos guerreiros
que procuram, que buscam alguém.

 

(em TAMPA DE CANASTRA)

 

José Tavares de Miranda, vitoriense nascido a 16 de novembro de 1919, filho do Prof. André Tavares de Miranda. Fez os primeiros estudos na Vitória, sob os cuidados do seu genitor, e transferiu-se para o Recife, onde teve grande atuação na imprensa. Mudando-se para São Paulo, ali concluiu o seu curso de Direito (iniciado na Faculdade de Direito do Recife) na Faculdade de Direito do Largo S. Francisco, em 1939. Escritor, jornalista e poeta. Teve vários livros publicados inclusive de poesias, sendo estes últimos reunidos em um só volume: TAMPA DE CANASTRA. Faleceu em São Paulo (Capital) a 20 de agosto de 1992.

Momento Cultural: Misturas (poema) – Por Egidio T. Correia

 

Misturamos e trocamos

As salivas em cada beijo.

Comemo-nos e saciamo-nos

No vil desejo.

Somos cúmplices caprichosos

Morrendo e renascendo em cada beijo.

Se é justo, sagrado ou profano,

Impróprio, imoral ou sacrilégio.

Atire a primeira pedra

O puritano.

Entre culpas, remorsos e desatinos,

Não sou homem adulto ou menino.

Julgamentos precisos ou imprecisos

Que se façam.

Se o sabor da vida é criminoso

Sou réu confesso e condenado,

Perante as correntes e amarras do destino

vivo acorrentado.

 

Egidio T. Correia

Momento Cultural: Estranho – João do Livramento.

 

Hoje olho para ti e não o reconheço

A tua face sempre firme e impávida

Se faz agora como a de tantos outros

Erigido antes em um firme rochedo

Reformaste o que perfeito estava

Hoje assentado em solo pantanoso

Vejo a lama invadindo a tua casa

Sem olfato inalas toda a podridão

Cego não enxergas tanta imundice

Grito teu socorro mas não escutas

Não quero teu horroroso presente

E fujo em direção ao teu passado

Pois é lá que encontro meu futuro

João do Livramento.