Momento Cultural: O Garoto – por Aliomar Vasconcelos

A praça ainda é a mesma.
A estação ainda é a mesma.
As lembranças são as mesmas.
Entretanto…
O trem não existe mais.
O relógio da estação não existe mais.
O velho chefe da estação não existe mais.
Recordações guardadas nas retinas daquele garoto.
Dez anos de idade…

Olha o amendoim! Olha o amendoim!
Torrado e Cozinhado! Quem vai querer?

Por que as lembranças ficam sempre nas estações?
Chovia muito naquela noite…Parado na estação, o garoto.
Um juvenil sonhador.
Sandálias surradas nos pés e uma camisa remendada a lhe cobrir o corpo franzino.
Uma cesta no braço e a esperança no olhar.
De repente, o apito…o farol…o trem.
Ansiedade? Talvez.
Quantos pacotes venderia naquela noite? E se não vendesse?
Dentro do trem, poucas pessoas compraram seus pacotes de amendoins.
Disputava a freguesia com vendedores de pipocas, rôletes de cana, bolos…
Desespero! O trem partira…
E ainda faltava receber por alguns pacotes que conseguira vender.
O garoto pulou do trem da vida.
Sem a sua cesta, sem as sandálias, sem o dinheiro apurado.
Sentado num banco de praça,
falara baixinho: amanhã será outro dia.
No seu rosto juvenil, uma lágrima se mistura com a chuva.
Era apenas um garoto…

Naquela casa simples (num beco estreito),
uma velha senhora o esperava angustiosa.
De braços abertos e com um coração cheio de amor e de ternura,
ela ficava olhando aquela rua, que parecia não ter fim.
De repente, no final da rua, aperece aquele garoto. Todo molhado.
Agora, estão juntos.

Na calçada, Dona Lola e o garoto se abraçam e choram.
Ele, por ter perdido – a sua cesta, as sandálias, o dinheiro…
Ela, por ver chegar à salvo, aquele garoto que tanto amava.
Hoje, os estrondos dos trovões, já não me assustam mais.
Dona Lola – Minha Mãe – me ensinou como vencê-los.
Não sei explicar o por que, mas hoje, já velho,
quando cai uma chuva torrencial com relâmpagos e trovões,
olho para o céu e vejo uma pequenina estrela brilhando.
Creio que seja Dona Lola me dizendo:

Não tenhas mêdo. Lembra-se de como ti ensinei a vencê-los?
Então, digo baixinho: Bença Mãe. E vou dormir.

Aliomar Vasconcelos é Professor e Escritor vitoriense.

Momento Cultural: Corsário – João do Livramento.

No partir da alegria se aportou a tristeza

Atracado no cais da noturna solidão

Te acorrentam as amarras da angustia

Sim teu coração bucaneiro escapa

Porém sem cartas ou astro que te guie

Logo adentra em mares desconhecidos

Invadindo o nevoeiro dos prazeres

Barco à deriva na procela das paixões

Quão imenso é o vazio deste oceano

Porto a porto segues errante ancorando

A taberna ou quem te serve não importa

Pois sedento qualquer rum te embriaga

Só assim terrível banzo não te aflige

Mas se pudestes embarcar o velho amor

Negra bandeira não mais flamularia

Lhe entregaria o timão da tua vida

Em calmaria passando assim a navegar.

João do Livramento.

Momento Cultural: Talvez (poesia) – Por Elmo Freitas

Talvez eu apareça
Talvez não.
Talvez eu adoeça
Talvez não.
Talvez eu apodreça
Talvez não.

Talvez eu mereça
Talvez não.
Talvez eu esqueça
Talvez não.
Talvez eu esclareça
Talvez não.

Talvez eu entristeça
Talvez não.
Talvez eu escureça
Talvez não.
Talvez eu enlouqueça
Talvez não.

Talvez eu te obedeça
E Talvez não.
Talvez sozinho eu esteja
E Talvez não.
Talvez… não.
Talvez…

Elmo Freitas – Poeta do “Os Confundidos”

Momento Cultural: Êxtase – Corina de Holanda.

Escancaro a janela de meus sonhos

E me debruço sobre o mundo, rindo,

Ao ver que até nos pantanais medonhos

Estrelas se refletem, traduzindo

A presença de Deus em tudo… Brindo

Então, com meus cantares mais risonhos,

O esplendor dessa lua que, surgindo

Enche de luz recantos tão tristonhos…

E já nem sei onde demore a vista:

Se no infinito azul, em que artista

Faz das estrelas trono da beleza,

Ou se na terra, mares e montanhas,

Rios, vales, florestas… Que tamanhas

Maravilhas pôs Deus na Natureza!

Agosto de 1972

Momento Cultural – BICHO TRELOSO – por Rosângela Martins

O tesão, Ave Maria, não marca hora pra chegar!
Não escolhe dia, nem lugar e dana a incomodar.
Trazido pelo vento, por um pensamento ou não.
Talvez animado e revivido por certa situação…
Esse bicho não espera: ou ele murcha ou explode.
Ficar parado? Não tolera. Cutuca, puxa, sacode…

Ele vai e vem, entra e sai, sem avisar.
Não vê hora e nem a quem vai provocar.
Oh, bicho treloso, atrevido, inconveniente!
Que só sossega quando fisga a gente.
Quando instiga, espeta, futuca, judia…
Santo Deus, assim é muita covardia!
Sem querer nem saber se o outro pode.
E fica cochichando no juízo: fode, fode!

Vixe, que nem reza nem santo consegue acalmar!
E só mesmo esse encanto a gente vem quebrar,
Quando encontra outro na frente do mesmo mal atacado.
E haja carinho pra acabar com tanto desejo acumulado!

Rosângela Martins – escritora. 

Momento Cultural: FORÇAS E ELEMENTOS DA NATUREZA.

Toda manifestação da vida, vibra num mesmo diapasão, tão harmonicamente afinado que faz soar em cada “eon” (período de tempo), uma verdadeira sinfonia das esferas. A maior ou menor quantidade de vibração é a manifestação das Energias Primárias.

A raiz de todas essas Energias Cósmicas que se polarizam no mundo de maneira dupla, chama-se Oceano Universal de Energia Vida. Essas Energias emanam do sol e se manifestam em três formas: Luz Primordial, Poder Ígneo e Base Energética Vital do mundo físico.

Cada uma dessas forças se manifesta em todos os planos do Sistema Solar. Elas permanecem distintas e nenhuma delas, em nosso plano, pode ser transformada na outra.

ELEMENTOS DA NATUREZA – São os princípios básicos de todas as substâncias que constituem os veículos da vida no Reino da Natureza.

Água – Constituída do elemento químico H²O.

Ar – Constituído do elemento químico .

Fogo – Constituído do elemento químico CO².

Terra – Constituído do elemento químico CL e CA.

Todos esses elementos são regidos por forças sutis.

(VERDADES FUNDAMENTAIS – MELCHISEDEC – Pág. 51)

Momento Cultural: Branca de Neve – por Henrique de Holanda.

Branca de Neve, Branca de Neve,
roseiral branco, cheio de espinho,
na minha história passaste breve,
mas perfumaste, bem, meu caminho…

Branca de Neve, por que partiste?
Ai! nem te digo, que ingratidão!
Nessa carícia também feriste…
magoastes tanto meu coração!…

Branca de Neve, indo-te embora,
no isolamento, com a dor, me tranco.
Deste-me a vida. Mate-me, agora,
Branca de Neve, veneno Branco!

Branca de Neve, cegonha triste,
tanto cismaste, tanto cismaste,
que de minha vida tu sumiste
na correnteza. Não mais voltaste.

És o motivo dos meus arquejos.
Por que levaste meu riso franco?
Branca de Neve, visão de beijos,
que é de minh’alma, pecado branco?

Mas, se voltares, sonho de arminho,
que me esmagaste, mesmo tão leve,
dentro da morte, direi baixinho,
ainda sorrindo: Branca de Neve!…

(Muitas rosas sobre o chão – Henrique de Holanda – pág. 10 e 11).

Momento Cultural: O HOMEM E A NATUREZA – por MELCHISEDEC.

A ingratidão é condição própria do ser humano, ele raramente reconhece os benefícios recebidos.

A Natureza supre o homem de tudo que é necessário para se manter vivo, entretanto, existem seres humanos que recebem todas as dádivas e são incapazes de agradecer.

A Natureza oferece sem paga, cereais, frutas, vegetais, leite, ovos, açúcar, calor, frio, luz, chuva, sol, água e ar, necessários à vida. Sem ela não haveria luz, calor, frio, chuva, sol e brisa.

Infelizmente o ser humano esquece que a vida é um ato de doação e recepção. O ato de dar implica necessariamente no de receber, porque é dando que se recebe.

O homem envolvido cada vez mais na existência material esqueceu os propósitos da Criação, convertendo-se em ladrão das dádivas da Natureza, por isso, tornou-se transgressor das leis naturais e responsáveis pelos seus atos.

Para se redimir de suas faltas é necessário que procure, na medida do possível, tentar mudar nas criaturas e em si próprio a mentalidade retrógrada, sempre voltada para o mal, procurando o caminho da iluminação, construindo a paz e o bem estar comum, no seio da sociedade.

(VERDADES FUNDAMENTAIS – MELCHISEDEC – pág. 77).

Momento Cultural: Velhice – por Aloísio Xavier.

Desafiei o tempo e triunfei.
Há mais de meio século resisto.
Sofrendo, embora, por aqui fiquei,
da vida não me canso e não desisto.

Espectro de gente me tornei.
O padecer me faz quase outro Cristo.
Morreram-me os entes que amei.
Ao meu desmoronar eu mesmo assisto.

Doente está meu corpo alquebrado
E esgotada tenho a pobre mente.
É triste, muito triste hoje o meu fado.

Meu ser, enfim, se encontra aniquilado.
Porém de todas essas aflições
mais me afligem as recordações.

Aloísio de Melo Xavier, vitoriense nascido aos 6 de junho de 1918. Professor da Faculdade de Direito de Caruaru, da Universidade Católica e da Faculdade de Direito da Universidade Federal.

Momento Cultural: FORÇA ESTRANHA – por Adjane Costa Dutra.

Imagino nas imagens espelhadas no tempo e no vento,

forças estranhas a percorrerem o espaço…

Do ar que eu respiro,

Do mar por onde piso…

Imagino imagens soltas e desconexas ao vento.

Imagino as pessoas, do que possam imaginar:

Dos instantes da vida.

Imagino os pensamentos soltos a evolarem como imagens;

simples imagens.

Imagino forças estranhas…

Estranho nas estranhezas e sutilezas dos amores falsos,

dos falsos amigos.

Imagino nas teias de uma rede feita por aranhas.

Imagino a melodia que estou a ouvir.

Imagino todos os meus sonhos soltos, dispersos como simples

castelos de areias.

Imagino o que eu escrevo e a fonte de inspiração que jaz numa

lápide fria dos meus sonhos.

Morreram sepultadamente:

sentimentos, esperanças, amores, dores,

e até a força estranha do que não imagino.

(TAPETE CÓSMICO – ADJANE COSTA DUTRA – pág. 47).

MOMENTO CULTURAL: ANTE UM QUADRO FELIZ – por Corina de Holanda.

Eu bem sei que no gozo da ventura,
é difícil lembrar
esse calix tão cheio de amargura,
que uma mãe quando baixa à sepultura
faz o filho esgotar.

Eu também, como tu, fui descuidada,
e junto à minha mãe,
vivi sempre feliz, sem pensar nada
do filho que a não tem.

Hoje eu não possuo e tenho a mágoa
morando dentro em mim
tenho sempre os olhos rasos d’água
diante d’um quadro assim…

E peço: ó, tu que tens para aquecer-te,
os carinhos de mãe!…
Com ela te oculta onde não chegue a ver-te
o olhar de quem não tem!

Arquivo da Família

Corina de Holanda

Momento Cultural: Menino Triste – por Stephem Beltrão

Para onde correres sempre serás
aquele menino!
Sempre acharás o vazio.
Verás, nas inquietudes tuas,
disformes ações, aceleradas, cruas.
Tens morrido e nascido todas as noites,
menino triste!
Como a dor cresceste nas passagens das coisas Algo flutua na crença que te torna magia.
Atirado nos congestionamentos do ser,
ganhaste a ti.
Tudo mais sobrou,
para contar as mágoas, que incomodaram
a tua agonia íntima dos sentimentos.
Curado das lágrimas do rosto, de sofrimentos
escondidos, quase rudes,
hoje sempre sorri, mas não choras mais.
O menino, que sempre se esconde
das coisas do mundo, se podou.

Momento Cultural: Martha de Holanda.

Espasmo… Vertigem do sétimo sentido do sol,
nos braços da terra…
Espasmo… O silêncio desvirginizando o tempo
no leito das horas…
Espasmo… A orgia da vida, na bacanal da morte…

Meu amor! Espasmo…
O meu beijo na tua boca…
Meu amor! Espasmo…
O teu beijo na minha boca…

Espasmo… A noite estava, com as estrelas,
arrumando o céu, para receber o dia.
O luar veraneava, longe, levando a sua bagagem de luz
E as ventanias passavam, correndo, para assistir ao
parto prematuro da primeira aurora.
E eu me desfiz dentro de mim…

Espasmo… A natureza parecia enxugar o seu vestido
cor de ouro debruado de azul, hemoptise do poente.
As nuvens voltavam, cansadas do trabalho das trajetórias,
a tomavam a rua das trevas.
Os pássaros acabavam de dar o seu último concerto do dia
na ribalta dos espaços, e recolhiam-se felizes nos bastidores
das folhas.
E eu me procurei em ti…
Espasmo… As raízes entregavam-se à terra,
para a eterna renovação dela mesma.
Os elementos tocavam-se na confusão das origens,
O éter, na elasticidade, dobrava-se
volatizando-se por todo o universo.
E, eu, te senti em mim.

Martha de Holanda, vitoriense, filha de Nestor de Holanda Cavalcanti e de Matilde de Holanda Cavalcanti, nasceu a 20.III.1909 e faleceu no Recife a 24.VI.1950. Casou-se com o poeta Teixeira de Albuquerque aos 8.XII.1928.

Momento Cultural: CASULO – por Rosângela Martins.

 

O meu casulo é como um ventre:

Lar, descanso, refúgio, parada.

Não há dor ou maldade que entre.

Tranqüilo, seguro, minha morada.

E, feito uma borboleta, sinto-me em formação.

Cada som, cada odor, parece me chamar.

Aguça meus sentidos, minha imaginação…

Desperta em mim o desejo de voar.

Mas minhas asas são delicadas e pequenas

E meu vôo é rasante e bem curto.

Mesmo sendo eu consciente e serena,

A minha vontade é apenas um surto.

Porque os cordões ainda estão amarrados.

Nas teias emboladas e grudentas me prendo.

Meus planos e sonhos, abandonados.

Levados pela correnteza a qual me rendo.

“Casulo”, poesia selecionada no concurso nacional novos poetas 2013, que faz parte do livro de antologia de poemas publicada em 2013.

Rosângela Martins

Momento Cultural: Faceirice Precoce – por ALBERTINA MACIEL DE LAGOS.

– Escutem: (mostrando cinco dedos)

Hoje completo cinco aninhos!…

E o meu nome?… todos o conhecem.

Vou pronunciá-lo: – Daciana!…

Lindo!… que melodia dimana!

E quanto a minha pequena – grande personalidade,

Vou (modéstia à parte), descrevê-la:

– Tenho a beleza da flor

e já, de imponente sultana

é o meu todo encantador!

Tenho uma boa mãezinha,

um painho carinhoso,

manos, avós, tiazinhas…

quanto o meu lar é ditoso!

– Duas estrelas, os meus olhos,

dois mundos, dois paraísos…

Da vida, entre os abrolhos,

fulguram os meus sorrisos (olhando o próprio tamanho):

Reparem como estou crescendo!…

No colégio vou entrar

para ir logo aprendendo

a ler, escrever e contar!

Passem bem

Tchau!

(SILENTE QUIETUDE – ALBERTINA MACIEL DE LAGOS – pág. 52).

Momento Cultural: O Sentido da Dor (poema) – por Elmo Freitas

O Sentido da Dor

Hoje eu tive a leve sensação de flutuar…

Tranquei-me em meu quarto e quando pensei
Que não suportaria a dor
que sobre caía em minha cabeça:
Adormeci…

Depois, não lembro muita coisa,
apenas um entorpecimento possuindo
minhas entranhas e elevando-se pela alma.
Eu não sabia que estava acontecendo, mas tinha a certeza de que
não estava morto, pelo contrário, sentia como se uma semente
de energia e vida brotasse dentro de mim.

Jamais havia sentido tamanho êxtase…

Contudo, o período de dor e inferno que vivi,
me levou a compreender uma coisa:
O sentido da dor.
Sim! Agora eu posso entendê-la. Sei qual a sua essência,
sua primazia e o seu…. O seu tormento.

Sei que ela virá novamente, mas antes…
Quero viver,
Porque é pelo peso da montanha que se mede o tamanho do inferno.

Elmo Freitas – Poeta do “Os Confundidos”

Momento Cultural: O SILÊNCIO – por Rosângela Martins

Fiel companheiro para as noites tranquilas. Dos sonos profundos ou das horas. Valioso nos momentos de observância; Realça e expõe o que tem relevância.

 O silêncio apura o sentir e, internamente, se faz ouvir.

 Quando é sinônimo de solidão. Enche de tristeza o coração. Pois o nada ou ninguém está contido nele também.

Retrato de incerteza e da insegurança exposta; Martírio para quem anseia por uma resposta. O silêncio pode ser traiçoeiro ou fiel amigo. Desde que se decifre o que nele está escondido!

Livro “Pedacinhos de Amor” – vencedor do 1º Concurso Trapiche de Contos e Poemas – janeiro 2018 – escritora Rosângela Martins.