Um morto andando pela cidade.

Amanheço morto na cidade. Tomo conhecimento de que morri logo cedo. Sou um morto muito especial, porque posso negar a minha morte, abrir a porta e sair andando, respirando o ar, rever as ruas, os lugares antigos por onde passei quando criança e que o tempo foi modelando, ora para melhor, ora para pior. Posso perceber, agora, que alguns lugares é que morreram. Caminho com um ar importante pelas ruas, porque posso descrever o que desapareceu. O cheiro do Café São Miguel, as meninas do Colégio Municipal, picolé de mangaba, disco de vinil com o retrato de Carlos Gonzaga, sessões dominicais de cinema, com sabor de ping-pong, Rock Lane a cavalo. Sou um morto que pode contemplar o nojo, a paixão e o tédio dos que me rodeiam e me julgam. Tenho direito a mais um dia, um jantar, telefonar para marcar um encontro. Principalmente, ir ao encontro e praticar, meticulosamente, a arte de dar e receber amor, como na milenar receita de Vatsyayana, o Kama Sutra de todo dia. Sinto-me vaidoso de minha morte – sem esquife, castiçal, lampejo de vela, coro lúgubre de carpideiras e meu derradeiro desfile, horizontal, pela cidade.

Respondo a alguém que me telefona para saber a verdade:

Morrer na boca do povo faz mais sucesso do que morrer de verdade. Não é todo dia que se é um morto andando pela cidade.

Sonho com alguém me perguntando: – Sosígenes, você andou morrendo ?

– Não, ando sem tempo para a morte.

Sosígenes Bittencourt

SIGNIFICADO DE COMUNISTA.

Se você perguntar a qualquer animal racional o significado da palavra “comunista”, todos saberão defini-lo, do matuto lá da roça ao sociólogo polonês Zigmunt Bauman.

Juca Chaves dizia que “Comunista é aquele que não tem nada e quer dividir com os outros.”

Como Juca Chaves era um comediante refinadamente sarcástico, irônico, eu resolvi também partilhar minha comédia. No meu entender, COMUNISTA É AQUELE QUE OFERECE TUDO DE QUE “VOCÊ” PRECISA PARA “ELE” SER FELIZ.

A ironia afia a inteligência.

Sosígenes Bittencourt

Fragmentos: FEITIÇO POR CIMA DE FEITICEIRO.

Se o Congresso Nacional era um grande circo, e o PT era o mastro da corrupção, foi um tiro no pé, a derrubada de Dilma. O circo desabou, e a empanada caiu por cima da plateia. Agora, não há mais sustentação política para a corrupção geral.

Não havia santo no Congresso Nacional. Quem não pecou por ação, o fez por omissão. E se quiseram crucificar Dilma para remir culpas, esqueceram que Dilma não fazia graça para operar salvação.



Sosígenes Bittencourt

VANDALISMO É ÓDIO DESORGANIZADO – Sosígenes Bittencourt.

É você, com raiva do vizinho,

chutar a cabeça do cachorrinho.

É você, com raiva da esposa,

esmagar uma mariposa.

É você, manifestado com o patrão,

bater no filho de cinturão.

É você, mordido com o presidente,

cutucar o cão com um tridente.

É você, arretado com a inflação,

atear fogo num caminhão.

É você, na maior pindaíba,

pular que só uma guariba.

Sosígenes Bittencourt.

TRANSPARÊNCIA E ÉTICA SEM MISTIFICAÇÃO.

NA SUÉCIA, JUÍZES E POLÍTICOS SÃO “CIDADÃOS COMUNS”

“A transparência nos atos judiciais do poder.” Esta é a teoria e a prática para a democracia sem arrogância, sem mentira, sem ditadura enrustida. Esta é uma ética moral, aquilo que foi ensinado e, exemplarmente, aprendido, sem mistificação.

As pessoas estão embevecidas com a LIBERDADE que pensam ter, sem a SEGURANÇA que precisavam ter. Liberdade sem segurança é loucura. (Freedom without security is madness).

Sosígenes Bittencourt

MARIA BETÂNIA VITORIANO PEREIRA – A menina de dona Jucélia.

Eu conheci, no curso Ginasial,
as 7 Maravilhas do Mundo Antigo: 
A Estátua de Zeus, O Colosso de Rodhes,
o Templo de Ártemis, O Mausoléu de Helicarnasso,
As Pirâmides de Gizé, O Farol de Alexandria
e Os Jardins Suspensos da Babilônia.
A menina de dona Jucélia foi uma das 7 maravilhas
de minha adolescência.
A menina de dona Jucélia não me permite ser um adulto definitivamente maduro; vez por outra me rejuvenesce,
me adultesce, fazendo-me adultescente.
Descongela, em mim, um menino que hibernava,
alargando meu passado e me distanciado da morte
às vésperas do crepúsculo de minha existência.

Sosígenes Bittencourt

COITO DE GATO – Sosígenes Bittencourt.

De madrugada, a lamúria de gatos em reprodução parecia um pranto de enlutados sobre um caixão. Seres humanos caem no choro quando perdem o objeto amado, ou partem para perpetrar crime, quando são vítimas de violenta paixão. Não há veterinário que me explique tanta choradeira num coito, como fazem os gatos, do Alasca à Terra do fogo.

Sosígenes Bittencourt

ENCONTRO CASUAL GRAMATICAL.

Encontrei-me, casualmente, com o curioso amigo Cristiano Pilako, na avenida 15 de novembro, em Vitória de Santo Antão, ladeado por minhas mãe Damariz e tia Ricardina, quando fui interpelado sobre uma dúvida na área da Língua Portuguesa.

Na realidade, a pergunta era a seguinte: quando se deveria usar “tem de” e “tem que”.

O uso correto, desde antigamente, é “tem de”, porque o “que” refere-se a um termo anterior, é pronome relativo. Como no exemplo: É possível que você tenha que me emprestar o carro hoje. (Observe que “tenha que” refere-se ao termo anterior “você” e indica uma possibilidade.)
Já, na oração, “A Prefeitura teve de indenizar os garis” – observe que “teve de” refere-se a um termo posterior “os garis” e indica obrigatoriedade ou necessidade. Compreende?

Agora, por causa do uso coloquial do “tem que”, praticado como uma anomalia gramatical prepositiva, foi absorvido como normal, não causando demérito a quem usa nem reprovando o incauto usuário.

Sosígenes Bittencourt.