TORCIDAS ORGANIZADAS LAMBUZAM O DOMINGO

Torcidas organizadas para brigar lambuzaram de sangue o domingo em São Paulo. Eram os obscuros da Mancha Verde e as rapinas da Gaviões da Fiel. São vândalos que destilam ódio desorganizadamente. O ódio desorganizado não tem direção e termina atingindo sem o crivo da razão. A quem odeiam, os corintianos e palmeirenses? Afinal, os seus clubes são abstrações, não existem fisicamente, existindo, na realidade, pessoas humanas que nada mais são do que semelhantes. Quando um palmeirense atira um rojão num corintiano, ou vice-versa, não são aos clubes que ferem, mas a eles mesmos. A bandeirado clube não tem vida, não jorra sangue, não morre. Enfim, quem perdeu a vida foi um cidadão que não tinha nada a ver com a confusão.

Portanto, briga encarniçada entre torcedores de futebol chama-se vandalismo d’alma, ódio desorganizado. Porque sentem ódio e não sabem lidar com esse sentimento inevitável, convertendo-o em prática criminosa.

É o animal humano que, com raiva da esposa, chuta a cabeça do cãozinho; o usuário do coletivo que, com raiva do aumento das passagens de ônibus, queima a barraca de jornal. E quando o fazem, coletivamente, é porque temem fazê-lo sozinho, escondendo-se noanonimato da multidão ensandecida. São impiedosamente covardes!

Ensanguentado abraço!

Sosígenes Bittencourt

Fragmentos

Anciã da Aldeia Yynn Moroti - Foto de Cristina OliveiraWherá

Anciã da Aldeia Yynn Moroti – Foto de Cristina OliveiraWherá

Indagaram uma anciã de 100 anos no cume de um morro no Rio de Janeiro: – Como está o seu colesterol, madame?

Respondeu: – Eu não sou do tempo de colesterol, não. Quem inventou colesterol foram os médicos.

Em seguida, insistiram: – A senhora tem medo da morte?

Respondeu: – Eu não. O povo tem medo da morte e está todo mundo morrendo.

Sosígenes Bittencourt

SEDE AO POTE

Eu sei que chocolate faz bem à saúde, sei que contém polifenóis, flavonóides;
que combate os radicais livres, é antioxidante, previne inflamações;
que escavaca as coronárias, descolando-lhes a borra, desentupindo a hidráulica sanguínea;
que enxágua nosso sangue, deixando-o limpinho, fininho, cheirosinho;
sei que auxilia a peristalse intestinal, fazendo a tripa colear que nem uma cobra; 
sei até que funciona como antidepressivo, libera feniletilamina, ocitocina, serotonina e dopamina, promovendo alegria e calmaria;
eu sei de tudo da chocolatria, da chocofilia, mas não precisa ir com tanta SEDE AO POTE.

Sosígenes Bittencourt

AFETO E LIMITE

Um cidadão me encontrou numa churrascaria e me revelou que havia gostado tanto de uma mulher que gastou tudo o que tinha. Vendeu o gado, o sítio, veio morar na cidade, tudo para gastar com a mulher que adorava. Depois, reduzido a uma caminhonete velha, a mulher o deixou.

Quer dizer, se ela não o queria com tudo que tinha, imagine sem nada do que tinha. Ou seja, ele, por excessivo afeto (afetado pelo afeto), por não impor limites à paixão, nunca percebeu o pecado que cometia. Daí, o castigo advindo.

Afetuoso abraço!

Sosígenes Bittencourt

NUA

Uma menina trabalhava, num barzinho, praticamente nua. Via-se-lhe toda fronteira das coisas proibidas. A bichinha era mesmo fraca depudor. Tinha até um risinho enviesado no canto da boca, como se sugerisse uma safadeza carnal. Só não andava completamente nua, porque a Polícia não consentia.

E eu, namorador, frequentava o local sempre com uma menina diferente, de amigas a namoradas. Naquele tempo, todo amostrado, levava uma carteira de cigarro no bolso e bebia Brahma Chopp. Fazia pantomima, erguendo o copo e dando baforada, querendo ser oHamphrey Bogart, mas parecendo um Don Juan de feira de mangalho.

Um dia, a atrevida veio-me e saiu-se com essa: – Êi, mestre, o senhor gosta tanto de namorar, admira tanto mulher e nunca disse nada comigo…

Aí, eu justifiquei: – Minha filha, se você andasse composta, ocultando as partes mais desejadas, talvez me despertasse mais apetite, me fustigasse a curiosidade. Mas, o que perguntaria, eu, sobre seu corpo, se está tudo à mostra, se suas carnes estão estendidas nos tabuleiros dos bares, na maior leviandade, aos olhos pidões da freguesia? 

Sosígenes Bittencourt

BIG BROTHER BRASÍLIA

Brasília é uma casa sem telhado. A culpa é da internet e da curiosidade dos homens. Você pode até não viver DA Rede, mas, inescapavelmente, viverá EM Rede, ou seja, enredado na teia da Rede. O risco é que você não poderá se policiar 24 horas no ar, porque ninguém é imune a fazer tolices, dizer besteira, cometer despautérios. E se a besteira for estrambótica, estapafúrdia, os homens da lei poderão pedir para quebrar o seu sigilo eletrônico. Aliás, há homens da lei também investigados. São humanos.

Urge que se aprenda a mentir com lógica e a memorizar a mentira. Porque o castigo do mentiroso é ter de se lembrar da mentira para não gaguejar e entrar em contradição.

O Big Brother Brasília dá prejuízo ao Big Brother Brasil, quebrando-lhe índices de audiência. São as audiências da Delação Premiada que transformam o Big Brother Brasil em menor entretenimento e menor piada. Não há personagem mais curioso, ao natural, do que um Dulcídio enfurecido resolvendo falar a verdade. E se todos os delatores estiverem falando a verdade, e se tudo for apurado e comprovado, todos estarão envolvidos por ação, ou omissão, o que redundaria em coletiva condenação.

Por enquanto, aos eleitores a teleaudiência das audiências do Big Brother Brasília, para reconhecer que a culpa não é só dos delatados, porque os delatados foram votados, e os eleitores são os mesmos telespectadores.

Big Abraço Brasil!

Sosígenes Bittencourt

SOLIDÕES

Uma mulher: – Professor, eu estou pensando em passar um tempo sozinha.
Eu: – Posso saber o motivo, madame?
A mulher: – Depois da última decepção que eu tive, eu pretendo passar dois anos sem querer ninguém.
Eu: – Coincidência. Eu também estou pensando em passar uns dois anos na solidão.
A mulher: – Eu sempre me senti solitária.
Eu: – Se você está solitária, eu estou namorando a solidão.
A mulher: – É como se a gente não valesse nada.
Eu: – Façamos o seguinte: vamos passar dois anos na solidão, eu e você? Ninguém bole com ninguém.
A mulher: – Mas, isso não vai dar certo, professor. Eu sou muito fácil de gostar.
Eu: – Talvez, aconteça o que dizia o escritor alemão Rainer Maria Rilke (1875-1926): Amor são duas solidões que se protegem.

Sosígenes Bittencourt

TALENTO E ARTE

Todo domingo, eu me lembro que sou um compulsivo colecionador de recortes de jornal desde menino, quando meu pai comprava o “Diario de Pernambuco”, e eu me punha a recortar as matérias e colecioná-las por assunto. Era danado pra ler Mauro Mota, Gilberto Freire, Selênio Homem de Siqueira, Ariano Suassuna, José Lourenço de Lima, Renato Carneiro Campos, etcétera. Outro dia, numa de minhas elucubrações, remexendo papéis de madrugada, encontrei um recorte já alaranjado pelos domingos, onde o poeta Marcus Accioly, numa entrevista, termina por dissertar sobre a diferença entre “talento e arte”. A pergunta era a seguinte:

DP – Não há forma para ser um bom poeta. Mas, existirão aquelas para não se fazer uma má poesia?Aí, Marcus Accioly – Perguntaram a um poeta espanhol o que era necessário para se fazer um poema. Ele respondeu que seria “começar por uma letra maiúscula e terminar com rima”. Perguntaram novamente: “E no meio?” O poeta respondeu: “Hay que poner talento.” Sabemos hoje que o poema não precisa começar com letra maiúscula nem terminar com rima, mas de talento ele continua precisando. Contudo, que não se confunda “talento” (que é um dom) com “arte” (que é uma técnica). Contam que Miguel Ângelo encontrou, ao acaso, uma pedra de mármore e ficou estático olhando a pedra. Alguém duvidou dele: “Você está vendo uma pedra?” O artista respondeu: “Não, estou vendo um anjo sentado.” O talento viu, intuiu o anjo sentado, mas a arte é quem retira da pedra o anjo de pedra. O poeta Sílvio Roberto de Oliveira me contou a história, quase estória, de um escultor popular que fazia ursos de madeira. Indagado como conseguia realizar tal tarefa, respondeu: “É fácil. Eu tiro da madeira tudo que não é urso, e só fica o urso.” Portanto, a única forma para não se fazer um mau poema é (re)tirar do poema tudo o que não é poesia. Assim – como disse Mallarmé – “restará arte ou quase nada”.

Sosígenes Bittencourt

REPERCUSSÃO DA PERCUSSÃO DE NANÁ

A repercussão da morte de Naná vem da percussão corporal do homem instrumental que era Naná.

O seu corpo era um bombo, sua boca, sua língua, um repique, um estalar.

Naná era o arauto do som, escondido entre as cidades e as matas brasileiras, no sutil movimento de estrelas na penumbra do ar.

Sua percussão e o seu brincar colecionou prêmios, entre Olinda e o mundo além-mar, abriu carnavais, viveu 71 natais, cuja morte não consegue olvidar. 

Parece até que Naná anda por perto, querendo ressoar. É a repercussão da percussão de Naná. 

Requiescat in Pace

Sosígenes Bittencourt

PITACO ESPORTIVO

Fortaleza 2, Sport 1

Quer conhecer o Brasil, coloque o vídeo do jogo e você o conhecerá. Pasmem! No meio do jogo, a torcida do Fortaleza quebrou um pau tão encarniçado que foi preciso a Polícia participar. Isso para prender aqueles mesmos torcedores de gangues rivais, de identidades e CPF’s já conhecidos e identificados pelos camburões cearenses. As cenas são de causar inveja a qualquer lutador de vale-tudo. Um torcedor atrasou-se na correria e tomou uma saraivada de cassetete de 5 policiais de uma vez só. Não sei como aquele cangaço humano ainda conseguiu ressuscitar.

E o jogo? Nada mais brasileiro. Uma corrupção. O Sport, de sapato alto, toma logo dois gols do assustado time cearense. Um Sport sem um ceitil de responsabilidade e compromisso com a torcida rubro-negra. Nem os mortos acreditavam na vitória do Fortaleza, que dirá os vivos. O treinador do Sport fazia mais munganga do que um palhaço de circo.

No finalzinho do Primeiro Tempo, o Sport vai lá e marca um gol que assombraria ainda mais o fraco plantel do Fortaleza. E a prova do pavor, veio no Segundo Tempo. Os jogadores danaram-se a cair no gramado, com medo de jogar. O jogo não foi jogado, foi interrompido e catimbado. E o juiz, naturalmente assustado, engoliu a corda, e o Sport não pôde revidar. Uma corrupção.

Escandalizado abraço!

Sosígenes Bittencourt

SUICÍDIO DE DR. EDMAR MIRANDA

Dr. Edmar Miranda, obstetra, formado em retirar o ser humano da bolsa uterina para o mundo escampo, suicidou-se em Recife. Atirou-se do 5º andar para os braços da morte, depois de mais de meio século de vida e de haver se dedicado à vida.

O suicídio é um crime sem réu, é um direito natural, não pode ser julgado pelos homens. O suicida opta pela morte para sair da vida, é uma saída. Porém, o suicídio é um crime que transgride a Religião. Rui Barbosa dizia: As leis são um freio para os crimes públicos – a Religião, para os crimes secretos. 

Requiescat in pace.

Sosígenes Bittencourt

A MOSQUITA “DE” DILMA OU A MOSQUITA “DA” DILMA?


Cuidado ao se expressar. O sulista tem mania de usar o artigo, ao pronunciar nomes próprios, como: o Carlos, a Fernanda, o Lula, a Dilma. Eu vi a Dilma. Eu vi o Lula. A casa da Dilma. A casa do Lula.

Observe. Dilma deve ter aprendido, depois do seu discurso hilário sobre o “aedes aegypti”, que o feminino de “mosquito” não é “mosquita”, pois trata-se de um substantivo EPICENO, ou seja, ele não sofre alteração morfológica na designação de gênero: masculino e feminino. Quer dizer, para você se referir à mulher do “mosquito”, você terá que acrescentar a palavra “fêmea”. O mosquito macho e o mosquito fêmea.

Agora, imagine se você usa o artigo A, antes do nome próprio da “presidenta”, no exemplo que vou citar. Ao invés de você dizer “a mosquita de Dilma”, que seria referir-se ao seu erro de Português, você diz “a mosquita da Dilma”, passando a chamar a “presidenta” de “mosquita”, o que não condiz com o seu aspecto físico nem sua letalidade de ordem política.

Docente abraço!

Sosígenes Bittencourt

MANHÃ DE SÁBADO

Manhã de sábado. O celular toca: 
– Está onde, professor?
– Viajando, minha filha.
– Viajando onde?
– Em minha casa.
– E sua casa anda?
– Não, estou lendo Manuel Bandeira. 
– E o senhor viaja, quando lê, é?
– Tem gente que viaja cheirando loló.
– Então leia pra mim.
– Veja essa, por exemplo:
BRISA
Vamos viver no Nordeste, Anarina.
Deixarei aqui meus amigos, meus livros, minhas riquezas, minha vergonha.
Deixarás aqui tua filha, tua avó, teu marido, teu amante.
Aqui faz muito calor.
No Nordeste faz calor também.
Mas lá tem brisa:
Vamos viver de brisa, Anarina.
Forte abraço!
Sosígenes Bittencourt