DOCE DE BANANA E PAU DE CANELA – por Sosígenes Bittencourt.

De manhãzinha, minha mãe manifesta o desejo de confeccionar um doce de banana. O doce é temperado com pau de canela. Aí, eu me apronto e vou comprá-lo no mercadinho do bairro. Tomo banho, boto perfume, costume antigo. Empertigado, decidido, vou desfilando pelas calçadas, narrando, em solilóquio, tudo que faço.

– Bom dia. Tem pau de canela?

O funcionário vai na frente e eu vou atrás, percorrendo o corredor de gôndolas.

– Quanto é o saquinho?

– Oitenta centavos, professor.

– Dê-me dois. (Relembrando que não se inicia frase com pronome oblíquo)
Dirijo-me ao balcão de frios e pergunto a um determinado cidadão: – O nome disso é pau de canela ou canela em pau?

Risadagem geral.

No momento da manufatura desta narração, o doce já está pronto, e a casa incendiada do aroma da guloseima, poética de ternura.

Feliz de quem pode desfrutar do tempo para escrever ou saborear uma leitura no mundo tão amargo e sem ternura que estamos vivendo.

Adocicado abraço!

Sosígenes Bittencourt

TRANSPARÊNCIA E ÉTICA SEM MISTIFICAÇÃO – por Sosígenes Bittencourt.

NA SUÉCIA, JUÍZES E POLÍTICOS SÃO “CIDADÃOS COMUNS”

“A transparência nos atos judiciais do poder.” Esta é a teoria e a prática para a democracia sem arrogância, sem mentira, sem ditadura enrustida. Esta é uma ética moral, aquilo que foi ensinado e, exemplarmente, aprendido, sem mistificação.

As pessoas estão embevecidas com a LIBERDADE que pensam ter, sem a SEGURANÇA que precisavam ter. Liberdade sem segurança é loucura. (Freedom without security is madness).

Sosígenes Bittencourt

CONVERSANDO BESTEIRA – por Sosígenes Bittencourt.

Um dia, eu voltava de Caruaru, de manhãzinha, depois de uma noitada com duas amiguinhas e haver adormecido no Hotel Continental, quando percebi que dirigia por outra estrada. Aí, interpelei um matuto:- Aqui, vai pra onde?

Aí, o matuto: – Vai pra Campina Grande!

Aí, eu engrenei uma marcha a ré e fui procurar Encruzilhada, uma cidadezinha do tamanho de uma encruzilhada. Lá, eu comi uma carne de sol com macaxeira tão gostosa que me danei a conversar besteira. Uma delas foi assim: – Você sabe por que a mulher do burro é uma besta?

Aí, as meninas: – Sei não, mestre.

Aí, eu: – Porque, quanto mais burro, mais besta ela fica.

Abestalhado abraço!

Sosígenes Bittencourt

Sócrates e Xantipa – por Sosígenes Bittencourt.

A esposa do filósofo SÓCRATES, dona XANTIPA, xingava o sábio no meio da rua, no mercado público, chamava-o de “mandrião”, ninguém jamais ouviu falar bem da genista, mas Sócrates a amava. Por isso, ela jamais o abandonou.

Contam que, certa vez, ao chegar atrasado em casa, Xantipa esbravejou e depois atirou-lhe água no rosto. Mas, Sócrates, com a paciência que a filosofia lhe facultava, respondeu: É isso mesmo, depois da trovoada, vem a neblina.

Sosígenes Bittencourt

MANGA COM SAL? – por Sosígenes Bittencourt.

Como eu fui criado chupando manga SEM SAL, nunca me acostumei com essa modalidade de chupada, essa aventura estomacal. E ainda há quem lambuze a fruta na laminha do sal com vinagre.
Na feira, a primeira pergunta era a seguinte: – Essa manga é docinha?
Aí, o matuto: – É um favo de mel, freguês.
Aprendi que SAL só serve para matar micróbio, dar gosto na comida e subir a pressão arterial. 
Comida insossa é um dos maiores castigos impostos à velhice. Assim como a privação do açúcar para os diabéticos. Não poder chupar uma manga rosa madurinha é terrível para quem sofre de HIPOINSULINISMO. Não poder passar a mandíbula num bago de jaca dura deve ser uma tortura.

Sosígenes Bittencourt

CELESTIAL E TERRENAL – por Sosígenes Bittencourt.

Os israelitas passaram 40 anos caminhando pelo deserto. O seu alimento vinha do céu, era o maná. No entanto, quando tentaram armazenar o maná, ele apodreceu. O alimento celestial era para ser consumido num dia. Isto significa dizer que quem guarda para o futuro, vê a vida apodrecer na palma da mão.

Todavia, referimo-nos a um alimento enviado por Deus. Ele nunca faltou. Nosso pão de cada dia anda produzido e vendido pelo homem. Portanto, há de se ter cautela.

O poeta romano Horácio, agoniado com a brevidade da vida, recitava:CARPE DIEM, QUAM MINIMUM CREDULA POSTERO. (Aproveite o dia, não acreditando minimamente no futuro). Contudo, o mesmo Horácio admoestava sobre o desperdício, aconselhando a moderação: EST MODUS IN REBUS (Há um limite nas coisas).

Sosígenes Bittencourt

Fragmentos – por Sosígenes Bittencourt.

*Não há nada mais eterno do que o passado, pela impossibilidade de modificá-lo – *Vejo poesia em tudo. Por isso, ando pela calçada – *Somos excelência em ciência e tecnologia, mas pobres em sabedoria – *Há amores acidentais e amizades essenciais – *Ando à procura de um “talvez”, e talvez você seja o meu “onde” – *Não há maior distração do que ser humano. – *Ninguém pensa nem age para ter paixão, mas pensa e age porque tem paixão – *Vivo estudando. Quando não tenho o que fazer, estudo – *Leio desde quando não sabia ler e escrevo desde quando não sabia escrever –*Todo homem crê no limite de sua fé e descrê no limite de sua descrença – *Forte não é quem bate, mas quem defende –  *Rico não é quem tem, mas quem ajuda – *Inteligente não é quem humilha, mas quem ensina.

Sosígenes Bittencourt

MENTIRAS ESPETACULARES – por Sosígenes Bittencourt.

A minha geração sempre foi alvo de duas mentiras espetaculares: O Brasil é o país do futuro, e o mundo vai se acabar. O “futuro” seria a “prosperidade”, e o mundo iria ser engolido por uma coivara de fogo, ou inundado por um gigantesco maremoto. O futuro não chegou, o mundo não se acabou, e a gente se acabando.

Sosígenes Bittencourt 

LOUCO DA BOA LOUCURA – por Sosígenes Bittencourt.

Eu sempre tive a mania de colar frases célebres no centro da cidade para o povo refletir. Sou um LOUCO da boa LOUCURA. Há quem colecione galo de briga e se acredite sadio.

O meu Quadro de Frases na cidade já me rendeu muitas alegrias. Em outubro deste ano, eu estava sentado na calçada de um restaurante, ao lado da Igreja da Matriz, quando um casal me convidou para conversar. Que grata surpresa! O rapaz tirou do bolso uma frase de minha autoria e explicou: – Esta frase me fez mudar de vida. Eu estava desempregado e sem ânimo para buscar uma saída, quando dei de cara com o seu Quadro de Frases. E lá estava escrito o seguinte: “O sol nasceu para todos, mas temos que sair da sombra.”

O rapaz já estava trabalhando e muito satisfeito por haver saído da sombra.

Motivacional abraço!

Sosígenes Bittencourt

PALESTRA NO PRESÍDIO DE VITÓRIA DE SANTO ANTÃO – por Sosígenes Bittencourt.

Módulo: O Nada que é Tudo

Houve pontos importantes que fiz questão de frisar, em minha palestra, para detentos no presídio de Vitória de Santo Antão. Dentre outros, discursei sobre a IRA e sobre a LIBERDADE.

A Ira é um sentimento que deve ser resignificado, ou seja, você deve trabalhar sua ira. Porque a ira tem função. Até Jesus, para disciplinar os mercadores, na orla do templo, baixou-lhes o chicote. Naquele instante, defendia a virtude, condenava o vício e preservava a casa de Deus.

Portanto, ensinava-lhes que a Ira tem de ser pensada. O importante não é a ira que se sente, mas aquilo que fazemos com a ira que sentimos. E a pergunta era a seguinte: O que vocês fizeram com a ira que sentiram?

Em outro momento, discursei sobre a Liberdade, o segundo maior bem da vida. Porque o primeiro maior bem da vida é a própria vida. E provei que os seus corpos estavam presos, mas ninguém jamais poderia aprisionar suas ideias. As ideias não são concretas, não têm substância. As ideias são abstratas. Você pode estar preso, mas suas ideias, fora do presídio. Baseado nesses argumentos, provei-lhes que a ideia de liberdade deve seguir as regras para obtê-la, e o melhor caminho seria seguir as múltiplas alternativas para conquistá-la. Que repensar a Ira e conviver harmoniosamente seriam as melhores opções para amenizar a dor da prisão e ganhar a liberdade.

Ao final, citei o exemplo de Nelson Mandela, que morou 30 anos na prisão e saiu com a ideia de acabar com a discriminação racial na África do Sul, obtendo um êxito sonhado a vida inteira.

Sosígenes Bittencourt

A HISTÓRIA DA ESQUERDA NACIONAL – por Sosígenes Bittencourt.

O Brasil assistiu a um Golpe Militar para impedir que se instalasse uma DITADURA, ou seja, foi Ditadura contra Ditadura. Decididamente, o Brasil não tem vocação para Direita. De um lado, os Políticos, que se aproveitam do poder para enricar, e do outro lado, os Capitalistas, que se aproveitam do poder para multiplicar suas riquezas, duas posturas de Esquerda. Esquerda é sempre conchavo de interesses e promiscuidade político-econômica. Direita é quando os Capitalistas fiscalizam a destinação dos impostos e cobram dos Políticos a eliminação da miséria, para a preservação da qualidade de vida de todos. Rico com medo de pobre não é rico, é pobre também.

A Esquerda prioriza a riqueza de poucos à custa da submissão de muitos. Ela é sempre Capitalista, o que confunde Economia com Política e gera capitulação de liberdade e predominância de medo, é sempre pobre. Não há riqueza sem paz, quando predomina o temor e consequente degradação de qualidade de vida. Talvez, por isso, Lima Barreto, jornalista e político carioca, tenha dito que “O Brasil não tem povo, tem público.” Quer dizer, em nenhuma fase da História do Brasil, o povo teve voz e vez.

Sosígenes Bittencourt

CRISTO E MALUF – por Sosígenes Bittencourt.

História engraçada conta o jornalista pernambucano Aldo Paes Barreto, em seu livro Causos & Casos, que acontecera em Nova Jerusalém.

Durante um espetáculo, em plena Campanha pela Presidência, Paulo Maluf está na plateia. No palco, braços abertos, Pilatos indaga a multidão diante do Palácio do representante romano:

– Povo de Jerusalém, não quero ser culpado pelo sangue de um inocente. Vós julgueis. O poder romano permite que eu solte um dos acusados. Solto Cristo ou Barrabás?
No meio da plateia, uma voz soou mais alto:

– Solta os dois e prende Maluf.

Sosígenes Bittencourt

NO BAR DA COCHEIRA – por Sosígenes Bittencourt.

O Bar da Cocheira fica como quem vai para o Matadouro. É uma casa de família. O barzinho é um fundo de quintal, de dona Léo de Zé Pedreiro. Quando bate a tardinha, sobe aquele aroma adocicado de chiqueiro de porco, relembrando a década de sessenta. Zé Pedreiro não diz nadinha, pai das meninas, de mulheres diferentes, todas contentes. A mais velha deve ser Maria de Nazaré, loirinha, meio sofrida por uma paixão que se acabou. Na televisão, toca até Zezo dos Teclados, com aquela gemedeira romântica que faz a mulherada querer beijar na boca. Tem dobradinha, quiabada, sarapatel, tripinha de “pôico”, tudo no estrinque. Chega dá vontade de tomar uma lapada de cachaça e passar a boca na manga da camisa. Todo ser humano tem um maloqueiro dentro do peito. Sobretudo se nasceu no interior, no tempo que fazer sexo era pecado e urinar na rua era falta de educação. Deus me defenda! No tempo que mulher da vida chamava-se rapariga e tinha mais vergonha na cara do que a geração de Malhação. Morreram quase todas. Outro dia, eu vi Maria Guarda-Roupa.

O Bar de dona Léo fica lá na esquina, como quem vai para o Matadouro. As meninas descem da Faculdade e vão beber cerveja. Tem até estudante de Pedagogia. Umas meninas sabidas, falantes, de batom, cabelo na escova e sandália de dedinho. Se não fosse isso, a vida seria muito chata.

Sosígenes Bittencourt

ABORTO, OPINIÃO E PODER – por Sosígenes Bittencourt.

É função de quem LÊ e ESCREVE, sobretudo quando publica o que escreve, facilitar, pedagogicamente, para a compreensão do LEITOR.

Por exemplo, o ABORTO é matéria que pode, evidentemente, ouvir a opinião do Presidente da República, mas não é matéria a ser decidida pelo Presidente da República.

Quando o Supremo Tribunal Federal decide pelo aborto em fetos ANENCÉFALOS (sem cérebro) estão no uso de suas atribuições e não estão acatando nem rejeitando a opinião do Presidente da República.

O que o povo quer é que o Representante do Executivo mande no LEGISLATIVO e no JUDICIÁRIO, o que caracterizaria um rompimento com a INTERDEPENDÊNCIA de poderes e recrudesceria os anseios ditatoriais do governante. Quer dizer, o povo pode optar pelo candidato que é a FAVOR, ou CONTRA o aborto, mas não pode querer que seja matéria decidida pelo Presidente da República. Seria misturar alhos com bugalhos em detrimento de si mesmo. Compreende?

Sosígenes Bittencourt

Fragmentos de mim mesmo – por Sosígenes Bittencourt.

Sou um amante da vida nos seus múltiplos aspectos. Aproveito tudo. A tragédia, por exemplo, tem me servido muito na criação de minha arte. Descobri, através do meu semelhante, que vim ao mundo para fazer graça e viver das graças. O riso é excepcionalmente benéfico à saúde.

Gosto tanto de mulher que não saberia dizer o quanto nem o que viria em segundo lugar. Não me casei ainda por causa das outras, mas não me considero imune ao matrimônio. Não sou gastador nem pirangueiro, mas considero que mais vale um prazer do que cem contos de réis.

Sobre Deus, penso como Camões: “O que é Deus ninguém entende, que a tanto o pensamento humano não se estende.”

Sosígenes Bittencourt

PENSANDO MESMO – por Sosígenes Bittencourt.

Eu sempre imagino que precisamos de dois profissionais antes de mais nada: um psicólogo e um professor de Língua Portuguesa. O psicólogo para nos revelar nossos transtornos psicológicos, e um professor de Língua Portuguesa para nos ensinar a ler e escrever. Infelizmente, estamos nas mãos de transtornos que desconhecemos e sem saber se estamos lendo e escrevendo corretamente.

Sobre mim mesmo, eu vejo poesia em tudo, por isso ando pelo cantinho da calçada. Porém, é o único transtorno do qual não desejo me curar.

Sosígenes Bittencourt

DO AMOR AOS GATOS OU AILUROFILIA – por Sosígenes Bittencourt.

Tudo na vida tem o seu dia de comemoração, mas os gatos têm dois dias: 17 de fevereiro e 8 de agosto. Apesar de arisco, não se dando com gritaria nem com carinho fora de hora, o bichano é considerado o mais popular do mundo.

Domingo, amanheci com um gatinho miando dentro da casa. De tão novo, não consegui entender como veio parar no jardim. Não conseguiria enguiçar o muro nem penetrar pela brecha do portão. Todavia, não era hora de especular sobre sua invasão. Dei-lhe leite e o coloquei numa caixa, forrada com um pano, para repousar. Ele mordeu o leite e fungou, como se procurasse peito, escorregou, lambuzou-se todo. Depois, deitou-se, espreguiçou-se, suspendeu as patas e começou a se lavar com a língua.

Porém, uma indagação sobrepairava a cena: Quem o ensinou a tomar banho? Quem lhe disse que a “candida albicans” de sua saliva serve de antibiótico para o seu corpo? De uma coisa, já fomos informados: os donos de gatos são mais introspectivos e sensíveis, o que significa dizer que os homens aprendem mais com os gatos do que os gatos com os homens.

Com a palavra, os ailurófilos.

Sosígenes Bittencourt