CONVERSANDO LOROTA

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Um dia, eu estava conversando lorota numa roda de mulheres faladeiras quando uma delas se saiu com uma conversa meio fútil, mas interessante ao mesmo tempo. É que eu perguntei por uma menina que conheci, meio namoradeira, moradora do bairro, e a língua de trapo pegou um ar desgraçado. A mulher virou-se numa chibata moral.

Disse que morou vizinha à família da escrachada; que o pai dela tinha uma venda de esquina, dessas de balcão de madeira, que vendia, de caramelo a candeeiro, de aguardente de cabeça a remédio pra dor de barriga, e falava mais do que o homem da cobra.

O defeito do pai da camarada é que batia com o nó dos dedos no balcão da venda e dizia que o dinheiro que tinha, nem Deus acabava. Ora, pelo que a linguaruda sabia, Deus tira a vida do homem, que dirá sua mercadoria. E largava o pau no condenado.

A gente se afastava da faladeira, porque, de tão entusiasmada, saltando de um pé só, uma veia pulada no pescoço, gritava e cuspia que nem uma doida.

Bem… para encurtar a conversa, contou que, de “repentemente”, foram surgindo mercadinhos por todo canto, como se fosse uma praga divina.

Os mercadinhos tinham preço, sortimento na moda, o cliente pegava nas compras com a mão, revirava, cheirava, apalpava e levava numa cestinha para pagar no caixa. Ninguém perdia tempo nem tinha conversa mole: – Muito obrigado, tenha um bom dia!
Quando se perguntava na rua: – Tu ainda estás comprando na venda de seu Fulano? – o interrogado respondia: – Deus me defenda!

Daí, o dono da venda quebrou, a filharada se dispersou, e me sobrou a menina que a faladeira só não a chamou de santa, porque Deus é Pai. Eu namorei com ela, comprei leite de vaca para o menino dela, mas nunca a vi tão avacalhada nem tanto adjetivo ruim como os que aquela marocas lhe imputou. Tem jeito?

Linguarudo abraço!

Sosígenes Bittencourt

VALDEMIRO, MILAGRE E IMPOSTO DE RENDA

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Perguntado, certa vez, sobre o que eu achava do Bispo Valdemiro Santiago, objetivamente, respondi: O Estado não tem nada a ver com a comunhão entre a “Fé” do bispo e seus enfermos. A Ciência não tem. A Bioética não tem. Sobretudo, a Seguridade Social. Mesmo que Valdemiro seja um carismático que engana burro para comprar cavalo. Não impõe-se discutir “milagre”. A questão central é a cobrança e destinação da arrecadação do Imposto de Renda. O senhor Valdemiro Santiago paga Imposto de Renda sobre suas riquezas, serras e quadrúpedes? Está tudo documentado, registrado, taxado? Qual a avaliação anual dos seus bens e qual a arrecadação concernente? Qual a destinação da arrecadação? Conheço professoras aposentadas, idosas, enfermas, que pagam Imposto de Renda, como se vivessem de renda, e não sabem por quê nem para onde vai o dinheiro. Portanto, esqueçamos o Bispo e cobremos prestação de contas ao Fisco.

Esclarecedor abraço!

Sosígenes Bittencourt

ESSE MÊS DE JUNHO

Esse mês de junho é, sem dúvida, o mês mais excitante e debochado do ano. Só se fala em namoro, beijo, a Espada de Apolo refletida no Espelho de Vênus. O mundo levanta a saia, desabotoa-se, caem os panos. É o mês do “frisson”, do friozinho na barriga. Diz que há 484 tipos de beijo; que o animal racional dá 24 mil beijos durante a vida; que uns beijam com a cabeça inclinada para a direita, porque ficaram envergados na cápsula uterina; que a saliva do homem injeta testosterona na boca da mulher para ela ficar querendo se entregar. Vinícius de Moraes inventou que “a hora do ‘sim’ é o descuido do ‘não’”.

As noites cheiram a lenha queimando, guloseimas de milho. O som é de estampido, sanfona gemendo, arrasta-pé. A visão é de Luiz Gonzaga entrando no céu com gibão e tudo. Tempo de olhares desconfiados, mãos bobas, a musculatura pegando fogo e as vísceras abdominais resfriadas. Raro o mortal que não cometeu uma safadeza carnal nesse clima. Às vezes, com quem nunca viu; às vezes, com sua prima. Descobriram até que casados gostam de boca cheirosinha a pasta de dente, e que solteiros são chegados a um cheirinho de álcool. Vôte! Tempo de mexerico, hipocrisia. Tem gente que mete o pau naquilo que mais adora. Diz que a língua tem toneladas de terminações nervosas, por isso beijar engatilha o desejo e faz bem à saúde. A beijoterapia ensina que a ocitocina faz um elemento ficar gostando do outro. Mas, diz que o beijo movimenta 29 músculos e permuta 250 bactérias, o que pode servir para espalhar a Gripe Suína. Deus nos defenda! Por isso, o jornalista italiano Dino Segre, popularmente conhecido como Pitigrilli, enredou que “o beijo é uma troca de bactérias em campo úmido.” Enfim, o beijo é um bicho danado.

Ninguém é o mesmo depois de um beijo.

Ensalivado abraço!

Sosígenes Bittencourt

O CATADOR DE LIXO

Na frente de minha casa, um catador de lixo, degradado, cata comida entre sacos de plástico biodegradável.

Porém, nada ensaca sem cheirar, amolegar ou chupar o dedo. Muito cuidadoso, vai separando o que julga comestível entre os detritos orgânicos em putrefação.

Olha para um lado, para o outro, como se temesse ser expulso de sua refeição por algum burguês metido a brabo.

De repente, todo espantado, é convidado por uma vizinha ao lado, que, generosamente, oferece-lhe pão limpinho em saquinhodegradável. Ele sorri, atravessa a rua e o recebe. Mas, devido à situação, retorna à degradante catação.

Depois, se cata e some em meio à poluição.

Degradado abraço!

Sosígenes Bittencourt

OPERAÇÃO “LAVA JATO”?

De saída, é bom observar que a expressão “lava jato”, sem hífen, não existe como substantivo. Ou seja, “lava jato” só poderia ser empregada em referência a um profissional que lavasse avião a jato. Exemplo: Seu Felisberto é um profissional que lava avião com propulsão a jato. Seu Felisberto lava jato. Portanto, “lava” seria verbo, e “jato”, substantivo.

Encontrei uma senhora, no meio da rua, que me perguntou o que eu achava da Operação Lava Jato. Ao que respondi: – Uma vergonha!

Aí, perguntei-lhe o que ela achava e logo obtive resposta: – Eu acho que a Justiça deveria pegar todos os políticos, colocar num avião a jato e atirar no mar, aí seria uma Operação Lava Jato.

Gramatical abraço!

Sosígenes Bittencourt

CONCURSO PÚBLICO DO INSS

Foram 120 questões a serem respondidas em 3 horas e 30 minutos, com direito a quesitos de Lógica, mas sem direito a usar sequer um anel de noivado e só podendo urinar escoltado.

O concorrente só poderia levar a prova se ficasse plantado na carteira escolar até o final do concurso, e, depois de entregar o gabarito, não teria mais acesso ao water closet.

Houve celeuma quanto a meninas que tilintavam de frio, outras que precisavam tomar remédio ou colocar algum alimento na mucosa estomacal.

Alguns imprevidentes tiveram que providenciar caneta com tinta preta em invólucro transparente.

Os mais descontentes criticavam, ora com furor, ironia, ou humorismo, bem ao estilo tupiniquim da pátria de Zé Carioca.

Depois, todos voltaram para casa, à Hora do Ângelus, mais desconfiados com o destino do que o gabarito de si mesmos.

Sosígenes Bittencourt

MORTE DE CAUBY PEIXOTO

Apesar da carinha de mulher e trejeitos femininos, Cauby Peixoto era adorado pelas mulheres mais refinadas e românticas do seu tempo e uma das vozes masculinas mais bonitas do Brasil. Cantor poliglota, já chegou a ser considerado o Elvis Presley brasileiro. O seu estilo era chamado de estilo “dândi”: voz grave e aveludada, cabeleira e figurino exóticos.

De família de músicos, Cauby era um carioca do signo de aquário, dado à luz em fevereiro de 1931. Risonho e descontraído, como se estivesse na aurora da existência, nem ligava para a contagem do tempo, dizendo que conservava a voz, não tomando nada gelado, totalmente sem vícios e nunca se aperreando. Indagado sobre o segredo de não se aperrear, confessava que era porque convivia com pessoas calmas. Naturalmente, era uma permuta de compreensão e paciência, porque os calmos mutuamente se acalmam.

Sobre o prazer de cantar, dizia que, se ninguém pagasse para ele cantar, pagaria para fazê-lo. 

E se alguém duvida do exposto, é só comprovar, ouvindo sua voz. Um verdadeiro espetáculo!

Requiescat in pace!

Sosígenes Bittencourt

MORTE DE SUSANNAH MUSHATT JONES

Gostar de viver foi a norte-americana Susannah Mushatt Jones. Dada à luz aos 6 dias de julho de 1899, desapareceu quinta-feira, dia 12 de maio, tendo habitado a Terra, fazendo parte da humanidade em três séculos: XIX, XX e XXI.

Apesar de haver sofrido escravidão e sido vítima de racismo, haver passado apenas 5 anos casada e comer toucinho defumado com ovos diariamente, Susannah não foi um ser humano poliqueixoso nem perdeu o gosto pela vida. Encantada com os estudos, ávida por conhecimento, dedicada às crianças e lutando por causas nobres, a supercentenária pugnou pelo voto das mulheres e direitos civis em geral.

Susannah não teve o amor de um homem durante sua longa existência, não teve riqueza e foi discriminada por sua origem e cor da pele. Contudo, não tinha vícios, nunca intoxicou o seu corpo com drogas recreativas, e amava incondicionalmente, o que tornou sua vida um exemplo de que “o essencial para a nossa felicidade é a nossa condição íntima, e, desta, somos nós os senhores” – como bem o dissera o filósofo latino Epicuro de Samos, nascido 341 anos antes de Cristo.

Requiescat in pace!

Sosígenes Bittencourt

MÊS DE MAIO – NO TEMPO DE EU MENINO

O mês de Maio sempre foi um mês dedicado à mulher. Mês de Maria, de se celebrar o namoro e o noivado, místico período entre os prazeres da carne e o sacrifício do espírito, o desregramento e a temperança, a fornicação e a castidade. Mês de se respeitar a mãe e desobedecer-lhe. Recebido com ovação, o Papa veio condenar tudo que é vontade do corpo e seduz o cérebro. Lembra-me O Êxtase de Santa Teresa D’Ávila, trespassada pela seta de um anjo, magnificamente burilada por Bernini, no século XVI.

Quem danado agüentava, em Vitória de Santo Antão, embora calma, sem os agitos nem a desobediência reinante de hoje, controlar-se, com a popularização da minissaia? De repente, quando não se podia ver um tornozelo, lá estavam os joelhos das meninas do Colégio Municipal e do Colégio das Freiras à mostra. Naquele tempo, o desejo vinha embalado pelas músicas de Roberto Carlos, Renato e seus Blue Caps e The Fevers, o que emoldurava o apetite com uma vaga sensação de amor. Ninguém sabia exatamente o que estava acontecendo, porque a Medicina ainda não mapeara o cérebro e a endocrinologia cabia em algumas folhas de caderno. Mas, só Deus sabe o quanto a enxurrada de hormônios fustigava a pele da adolescência de tanta emoção. Os namoros eram na calçada, fiscalizados, com hora marcada. Cinema, só com acompanhante, geralmente um irmãozinho bobo, comedor de bombom, mas fuxiqueiro, cujo perigo residia em contrariá-lo. Os cinemas eram o calorento Cine Braga e o inesquecível Cine Iracema, espaçoso, onde se podia procurar um lugar mais reservado para beijar. Todo mundo ficava tomado, neste mês de maio, de uma expectativa de noivado, casamento e maternidade. Festejava-se a mãe, a namorada e se fazia plano para o futuro. Chegávamos a imaginar como seriam nossos filhos. Se pareceria com a mãe ou seria uma escultórica mistura dos olhos de um com o nariz do outro. Eita, mundo velho!

Sosígenes Bittencourt

O TAL DO BOLSA-FAMÍLIA

Duas mulheres revelaram, esta semana, que jamais apoiariam o impeachment de Dilma, pois recebiam Bolsa-Família. Uma delas, inclusive, salientou que votou em Dilma com medo de Marina Silva, porque Marina ameaçou cortar o benefício.

Indagada se ela conseguiria sobreviver com o Bolsa-Família, responderam que “não”, mas que, sem ele, seria pior.

Ora, nenhum cidadão de vocação judaico-cristã seria contra qualquer benefício financeiro concedido, pelo governo, ao povo. Contudo, os beneficiados pelo Bolsa-Família não compreendem que o auxílio é um anzol para pescaria de voto e não avaliam os malefícios causados pelo desmoronamento dos serviços públicos.

O nível de percepção de nosso povo é muito prejudicado pela falta de educação. Daí, muitos, esquecerem a dignificação do trabalho e se agarrarem ao Bolsa-Família como último galho ressequido em meio a uma inundação.

Esta observação, não obstante, não incrimina unicamente Dilma Roussef, mas todos que procederam ou procedem desta forma. Por exemplo, se Michel Temer e Aécio Neves estão de tal forma animados com o impeachment de dona Dilma, por que não cortam os benefícios que julgam eleitoreiros e mantenedores da miséria e anunciam investir em Educação, Segurança e Saúde, para enfrentar as urnas como cidadãos que dignamente resgataram o povo dos crimes cometidos pelo PT? Fica a indagação.

Sosígenes Bittencourt

DIA DAS MÃES

Hoje é dia das mães.
Ontem foi dia das mães.
Amanhã será dia das mães.
Todo dia, todo tempo é dia das mães.
Enquanto houver uma pulsação de amor,
onde houver o ato da fecundação
será momento de se comemorar a vida.
Hoje é dia da vida, é dia do mundo. 
Não foi em vão que já se chamou a natureza
de Mãe Natureza.
Hoje é dia do instinto,
do misterioso impulso para a multiplicação,
de toda forma de vida,
dos micro-organismos, de todos os animais, dos vegetais.
Hoje é dia das mães.
Hoje é dia da vida.
Hoje é dia de Deus.

Sosígenes Bittencourt

RECEITA PARA ENCANTAR MÃE SOLTEIRA

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Um dia, eu conheci uma morena amamentando uma menininha. Era uma moça pobre, com cara de indígena, os olhos amendoados, o cabelo derramando-se em volta do rosto, rolando pelo pescoço. Era todinha uma índia, os seios sacolejando por trás da blusa, desprovidos de corpete. Eu só me lembrava dos irmãos Villas-Boas, dos acessos de malária, cara pintada, milho e mandioca.

Todavia, para conquistar mãe solteira, é preciso um certo talento, um certo jeito e muita paciência. Eu via aquela menininha que parecia uma indiazinha, nos braços daquela morena avermelhada, sugando-lhe as tetas com tanta ternura; ela, calada, olhando para dentro de si mesma. Ficava meio enxerido, querendo participar daquilo que não me pertencia.

Foi, foi, foi, um dia, devagarinho, movido pela ajuda, todo cuidadoso, peguei a menininha nos braços. A menininha pousou o cocãozinho no meu ombro, toda vazia da figura paterna, deu um suspiro e adormeceu. Juro que senti vontade de chorar, mas a alegria conteve minha lamúria. Fiquei todo invocado, parecendo que havia recebido um presente. Os olhos da moça brilharam, as escleróticas se umedeceram.
Aí, eu fui pegando gosto, botando a menininha no meu coração. Quando você bota filho de mãe solteira no coração, ela começa a se aproximar do seu coração. De sorte que, toda vez que a moça via a menininha aconchegada, começava a sentir frio. Estava criada a melhor receita para conquistar mãe solteira.
Sosígenes Bittencourt