Desde a chegada do português Diogo de Braga ao nosso torrão – há quase 400 anos – tivemos vários modelos de governança. Até ascendermos à categoria de “Vila”, em 1812, na qualidade de povo, ainda não tínhamos “as rédeas” do nosso próprio destino.
Mas foi a partir da república – 1889 – que, do ponto de vista administrativo local, as coisas começaram a se encaixarem – “mais ou menos” – tal qual o modelo que conhecemos nos dias atuais. Nesse contexto, realcemos o nome do primeiro prefeito da Cidade da Vitória: Doutor José de Barros de Andrade (1892 a 1895).
Pois bem, na qualidade de cidade interiorana brasileira/nordestina – fincada no coração da Zona da Mata pernambucana – o nossa lugar também vivenciou o ciclo da cana de açúcar e dos seus engenhos. Em ato continuo conheceu várias figura e situações. Dentre as quais, destacamos: “senhores de engenho”, “coronéis da política”, “voto de cabresto”, “curral eleitoral” e etc.
Salvo pesquisa mais aprofunda, desde o doutor José de Barros de Andrade, até os dias atuais, já tivemos 28 prefeitos – valendo lembrar que alguns nomes governaram a cidade por mais de uma ocasião.
Pois bem, nessa linha de raciocínio poderíamos afirmar que o auge dos prefeitos com práticas mais salientes – autoritárias, protecionistas e extravagantes – deu-se com mais vigor na primeira metade do século XX.
Nesse recorte temporal era muito comum e até “normal” que os poderosos da época confundissem frequentemente o que pertencia ao erário e/ou o privado. O “capital político pessoal”, por exemplo, era um bem quase indissociáveis do patrimônio familiar, via de regra a ser herdado por um dos membro da prole, quase sempre reservado ao primogênito – resquícios do período absolutista.
Para exemplificar, no sentido da linha política herdada pelas gerações seguintes, lembremos a emblemática figura do Coronel José Joaquim da Silva, prefeito da nossa cidade que conseguiu seu primeiro mandato por ocasião de um ato particular do governador do estado de então, fruto, entre outras coisas, de uma indicação do Mestre Aragão que também governou a cidade – primeiro, na qualidade de prefeito interino, posteriormente nomeado em definitivo (1942 a 1944).
Eis que adentramos no tão esperado, sonhado e até “temido” século XXI – dizia-se antigamente, inclusive, que o mundo iria acabar no ano 2000. Com a chegada do novo tempo, a chamada “Era da Tecnologia”, da “Comunicação”, da “Pós-Modernidade”, “Das Transformações”, “Da Ciência” e etc, contudo, imaginava-se mudanças de toda ordem, sobretudo nas práticas políticas. Mas na Vitória de Santo Antão, por incrível que possa parecer, inauguramos um tempo “invertido”, por assim dizer, nunca antes visto no nosso lugar, nem nos áureos tempos dos senhores de engenhos……Vejamos:
No embate eleitoral municipal do ano 2000, contrariando a lógica à época, elegeu-se o prefeito Zé do Povo. Em 2008, na eleição mais polarizada da história da cidade, voltou ao poder municipal, pela 3ª vez, o prefeito Elias Lira. Contrariando a lógica eleitoral em mais duas ocasiões, 2016 e 2020, ascenderam ao poder executivo as candidaturas oposicionistas, Aglailson Junior e Paulo Roberto, respectivamente.
Mas o que existe de igual e tão parecidos nos respectivos projetos políticos/administrativos dos prefeitos da Vitória do século XXI? Observemos:
Sentado na cadeira mais importante da Palácio José Joaquim da Silva Filho, em 2002, o Zé do Povo “transferiu” da Câmara de Vereadores da Vitória para a Assembleia Legislativa do Estado de Pernambuco o seu filho, Aglailson Junior, quando o mesmo “deu carga” na sua candidatura a deputado estadual.
Já o então prefeito Elias Lira, nas eleições gerais de 2014, não mediu esforços para “presentear ” o seu filho, Joaquim Lira, com um assento na ALEPE – detalhe: até então, o referido filho dizia publicamente que não suportava política…..
No dia da posse, na qualidade de gestor maior da Vitória, em 1ª de janeiro de 2017, o então prefeito Aglailson Junior, em ato simbólico, lançou a candidatura do seu filho, Aglailson Victor a deputado estadual. Resumo da opera: em 2018, um dos mais votados do estado.
Impactada pela pandemia do novo coronavírus, as eleições municipais de 2020 foram ameaçada de serem efetivadas. Com “atividades de rua” comprometidas, segundo observadores da cena eleitoral, o pleito foi decidido na internet. Com mais desenvoltura e prometendo ser diferente de todos, levou a melhor o postulante Paulo Roberto.
Sentado na cadeira de prefeito, Paulo “produz” uma candidatura à Câmara Federal. Assim como todos os prefeitos da Vitória do século XXI, repete a mesma fórmula (um membro da família) ou seja: retira do sofá da sala de casa o seu projeto eleitoral, apoiando e investindo no nome da sua filha, Iza Arruda – neófita na atividade política. O êxito na referida empreitada se configura numa grande incógnita até o momento.
Eleição – antes de mais nada – é um momento de reflexão. Estaremos recebendo, doravante, um grande volume de informação e propaganda eleitoral, via internet, rádio e televisão – que se iniciará amanhã, sexta-feira (26). Precisamos ser mais racionais e menos emocionais, afinal votar, primeiramente, é um ato de esperança coletiva. O passado, já passou! O presente é “massa e tijolo” na construção de um futuro melhor….
Portanto, para concluir essas linhas que julgo ser um singelo, mas importante documento histórico/antropológico/sociológico do nosso lugar, sem nenhuma vaidade ou desejos tolos, imagino ser, este, um conteúdo contributivo na formação do chamado “debate político produtivo”.
Salvo engano, nenhuma outra cidade pernambucana, nordestina ou mesmo brasileira produziu, a partir do século 21, uma sequência tão “sus generis” quanto a nossa, no que se refere à prática política eleitoral dos prefeitos, atinentes aos seus respectivos projetos eleitorais familiar. Afinal, qual a Vitória que você deseja: a do século XX ou a do século XXI?