CUIDADO COM JANEIRO – por Sosígenes Bittencourt.

Obviamente que eu não diria “cuidado com o Natal”, porque o nascimento de Jesus não tem nada a ver com isso. Porém, diria que é preciso segurar a emoção com o lado consumista da festividade, para em janeiro não estar com a mão na cabeça, por causa da farra financeira. Segundo alguns discursos evangélicos ou pastorais, Jesus é razão.
Não há riqueza maior no ser humano, força mais criativa do que a emoção, mas é preciso administrar seus excessos com a intermediação da razão. Napoleon Hill já o disse: “O entusiasmo é a maior força da alma.” Contudo, ‘entusiasmo’ deriva de “em + Teos”, ou seja, com Deus na alma, em estado de graça. Não adianta você cobrir-se do supérfluo, para depois carecer do essencial.
“Cuidado com Janeiro” significa “cuidado com as dívidas”. Outro dia, vi um economista dizendo que ninguém trabalha para pagar contas, trabalha para se manter. Quem recebe para pagar, não recebe, transfere. Ademais, é preciso confeccionar um colchão de segurança, para nas vacas magras ter como se socorrer. Não vá com tanta sede ao panetone, lembre-se do pão nosso de cada dia.
Prudente abraço!
Sosígenes Bittencourt

OS ABUTRES DE GARANHUNS OU OS COZINHEIROS DO DIABO.

Nem o Conde Drácula, que chupava sangue humano para sobreviver, deglutia papinha de carne de defunto. Drácula era mais higiênico, menos seboso, chupava gente viva, saboreava tudo fresquinho. O Vampiro da Transilvânia penteava os cabelos, andava de paletó engomado.

Certa vez, uma moradora de Olinda deglutiu um seio putrefato com xerém, que encontrara num lixão, mas não sabia. Coitada, ficou cheia de nojo depois da fuxicada.

Os abutres de Garanhuns são diferentes. Contratam babá para tomar conta de uma menina, abatem-na a cacete e faca peixeira, esquartejam, retalham, para fazer rosbife e salgadinho. A menina, considerada uma deusa, também se alimenta da suculenta carne de defunto.

Diz que a Scotland Yard, a polícia metropolitana londrina, andou dando tiro de cadaverina para repelir convulsão social, espalhar tumulto de rua. Acabou-se. Nem os policiais aguentavam a fedentina.

Os urubus de Garanhuns cortam a carne – nem sei se lavam, nem sabemos se cheiram – vão logo preparando as refeições. Três cidadãos garanhunhenses, sentados na praça, barrigudos, jogando dominó, comeram empadas e coxinhas, recheadas de carne moída de cadáver. Cadáver quer dizer “carne dada aos vermes”. Os tapurus eram eles. Que seboseira…

Como se trata de um triângulo amoroso, seu Jorge, Bruna e dona Isabel devem ser tarados. Misturam sexo com sangue coalhado, ritual de sacrifício e carne podre. Como também preparam tira-gosto, são manicacas de Belzebu, cozinheiros do Diabo. Será que tomam banho, escovam os dentes, botam desodorante nas axilas. Ou têm bafo de múmia, catinga de sovaco, intimidades fedorentas? Onde serão encarcerados? Melhor sepultá-los juntos, para uma transa sensual, essa trupe de papa-defuntos.

Sosígenes Bittencourt

Pensar e Sentir – por Sosígenes Bittencourt.

Sentimento é pau-mandado, depende do pensamento. O coração é o termômetro da emoção, a mente é que ama.

Pensar é tão rápido que você pensa que SENTIU e NÃO PENSOU. É preciso pensar no que se sente, mas, sobretudo, pensar no que se pensa. Pensar naquilo que se pensa é filosófico, é indagação de relação de causa e efeito.

Sosígenes Bittencourt

DESEJO E BOM-SENSO – por Sosígenes Bittencourt.

O homem não deseja o que é Bom e Belo, ele deseja um objeto. Portanto, é preciso avaliar o que se deseja, pois desejo não tem bom-senso. Ou seja, uma vez satisfeito o desejo, o que se desejava não passa a ser aquilo que se quer.
Por exemplo, desejar chocolate não significa querer chocolate. Pelo contrário, depois de matar o desejo, o que você mais queria era não desejar chocolate.
Todo viciado deseja aquilo que o prejudica, porque não tem controle sobre o que deseja. A diferença entre o remédio e o veneno está na dosagem. O casamento não dá certo porque você deseja a pessoa que não quer.

Indesejável abraço!

Sosígenes Bittencourt

NINGUÉM MELHOR DO QUE OS AMIGOS – por Sosígenes Bittencourt.

Ninguém melhor do que os amigos
para relembrar o que nunca esquecemos.
Ninguém melhor do que os amigos
para nos auxiliar a redigir a nossa história.
Ninguém melhor do que os amigos
para rejuvenescer ainda que estejamos envelhecendo.
Porque ninguém melhor do que os amigos
para decodificar nossa linguagem,
entrever nossos sonhos e reacender nossa esperança.

Sosígenes Bittencourt

ENSINAR E EDUCAR – ESTUDAR E APRENDER – por Sosígenes Bittencourt.

 No meu tempo, Ensinar e Educar eram palavras bem definidas. Ensinar significava, pela origem da palavra, “imprimir conhecimento”, e Educar, pela origem da palavra, preparar para a vida, preparar para o mundo. Daí, a primeira escola do homem ser o lar, no seio da família. Ao chegar à escola, o aluno deveria estar educado para viver no mundo escolar, conviver com colegas e professores, ou seja, tinha de ser um discente a saber respeitar o corpo docente. Assim como, no caminhar até a escola, na rua, entre as pessoas, por onde andasse. Esta função inicial era função dos pais, com quem convivia.

O resultado desta ordem era silêncio em sala de aula, maior capacidade de concentração e, consequente, melhor condição de aprendizado. Porque o aluno, em sala de aula, ele é coletivo e passivo, ou seja, ele recebe a aula em grupo, enquanto que, em casa, ele é solitário e ativo, ou seja, revê as matérias para retê-las. Observem como a educação doméstica é importante no aprendizado. Porque escola não é lugar de distração, é lugar de concentração. É lá que você recebe o conhecimento para retê-lo em casa. Se isso não acontecer, não havendo aprendizado, não se completou o ensino e todo o tempo foi perdido, todo esforço, inútil. Portanto, não adianta escola toda enfeitada, bem mobiliada, com todo o aparato tecnológico à disposição da transmissão do conhecimento, com alunos dispersos e sem a educação doméstica necessária ao interesse pelo projeto educacional. Apesar de acharem que o importante é se comunicar, que falar e escrever corretamente é coisa do passado, este é um péssimo conselho para quem pretende ser sabatinado por um Concurso Público ou ter acesso à Faculdade através de Vestibular. Um advogado que cometa erros comezinhos de gramática pode ter suas petições relegadas a segundo plano por um juiz exigente.

Portanto, falar e escrever corretamente não é irrelevante quando se trata de conquistar emprego ou profissão liberal. No mais, o conselho que se deve dar a qualquer aluno é não estudar para fazer prova. Quem estuda para fazer prova está tentando decorar para responder questões formuladas. O correto e eficiente é entender para decorar. Quem entende, memoriza; Quem memoriza nem sempre entende o que memorizou. Estudar não dói; pelo contrário, nos alivia do desconhecimento, nos conforta. A capacidade de aprender é o mais importante e belo dom da natureza. Estudar e aprender é uma alegria, não é uma tristeza.

Sosígenes Bittencourt

A BUSCA DA FELICIDADE – por Sosígenes Bittencourt.

O grande obstáculo em ser feliz está na busca da felicidade, é procurá-la onde não está, é buscá-la no mundo, nos seres inanimados. A felicidade está naquilo que depende de você, no abstrato, aquilo que só existe ENQUANTO você produz. Eis o segredo, eis chave, o caminho. O amor não existe ENQUANTO você não produz. Já o mundo não depende de você para existir, ele é concreto. Portanto, o amor é a essência da felicidade. O cineasta Franco Zefirelli disse que “O homem, desde o Egito até nossos dias, é movido por dois sentimentos: A ânsia de amar e o temor da morte.

Não obstante, em que creem os religiosos? O que se lê em João, 14:27, “Deixo-vos a paz, a minha paz vos dou; não vo-la dou como a dá o mundo. Não se turbe o vosso coração, nem se atemorize”.

Sosígenes Bittencourt

MENTIRAS ESPETACULARES – por Sosígenes Bittencourt 

A minha geração sempre foi alvo de duas mentiras espetaculares: O Brasil é o país do futuro, e o mundo vai se acabar. O “futuro” seria a “prosperidade”, e o mundo iria ser engolido por uma coivara de fogo, ou inundado por um gigantesco maremoto. O futuro não chegou, o mundo não se acabou, e a gente se acabando.

Sosígenes Bittencourt 

E por falar em tristeza – por Sosígenes Bittencourt.

Eu sou meio ruim de tristeza. Pelo contrário, carrego uma certa alegria n’alma que, muitas vezes, confundem com falta de seriedade. Porque o importante não é a tristeza que você sente, mas o que você pode fazer com a tristeza que sente. Tristeza longa, duradoura é depressão. É caso clínico. Eu prefiro a tristeza que é caso cínico. Dizia, o dramaturgo Nelson Rodrigues, que “não se faz literatura, política e futebol com bons sentimentos.”

Por exemplo, a tristeza, para mim, é motivo de literatura. Eu recebi um grande conselho do poeta alemão Wolfgang Goethe: Faz da tua dor um poema, e ela será suavizada.

Sosígenes Bittencourt

Recordar é Viver: Madre Tarcísia

A vida é feita de tempo e daquilo que fazemos com o tempo que dispomos. O tempo é o tecido de nossas vidas. Portanto, recordar é estender o tecido de nossas vidas.

Esta era uma fotografia muitíssimo aguardada.

Fui recebido por Madre Tarcísia (Dalka Pitanga de Mesquita), no Colégio Nossa Senhora das Graças, por indicação do professor Pedro Moura. Fui ministrar aulas de Língua Portuguesa e Literatura Brasileira.

Madre Tarcísia era uma religiosa sem perder a compreensão do humano, humana sem perder a fé na conversão do homem. Maleável como um rio que contorna os obstáculos. Por isso, tinha autoridade, servindo de lição ao autoritarismo. Autoritarismo é imposição, autoridade é convencimento. Autoritarismo gera rebeldia, autoridade gera obediência. Fui ensinar e terminei aprendendo.

Sosígenes Bittencourt

ESTUPRO E MULHER COM A NÁDEGA DE FORA – por Sosígenes Bittencourt.

Eu costumo dizer que julgo ser mais prazeroso beijar uma mulher com o seu consentimento do que manter congresso sexual com uma mulher sem sua permissão. Contudo, no primeiro caso, o cidadão deve ser considerado um sujeito normal; no segundo, um psicopata. Um homem pode desejar uma mulher e mudar de tática para conquistá-la, mas não pode usá-la sem sua aprovação, é caso de Justiça.

Cada estuprador ataca sua vítima por questão singular. Há estuprador que enguiça o muro do cemitério para copular com uma falecida, confundindo estupro com profanação de cadáver. Outro não pode ver uma mulher com a nádega de fora – o que não significa dizer que a vítima seja “cúmplice” – o seu azar será apenas a coincidência de cruzar com um “bundomaníaco”.

Oportuno salientar que o psicopata sabe exatamente o que está praticando, que está cometendo crime, que poderá ser linchado na via pública ou estuprado no cárcere, porém não consegue conter o seu apetite criminoso. Contrário ao doido, que não sabe lidar com suas emoções e fica abestalhado, olhando para o objeto do desejo.

Portanto, descartemos a ideia de que homem pega mulher a pulso porque ela está com as fronteiras proibidas de fora. Um cidadão normal lança um galanteio, oferece-lhe uma rodada de chopp, ou a convida para dançar. O estuprador pega uma faca e fica por trás de uma parede, como num filme de terror. Às vezes, fica tão descontrolado que não escolhe o lugar e acaba nas mãos da população – doida por um tarado para descarregar o seu desejo de matar. Azar do estuprador.

Enfim, lugar de estuprador é preso, e mulher brasileira, se tivesse cautela, não andaria nua. O brasileiro, em geral, é enxerido, quando o namorado vai urinar, ele tira sua namorada para dançar.
Cauteloso abraço!

Sosígenes Bittencourt

A televisão na minha visão – por Sosígenes Bittencourt.

A televisão é uma concessão de serviço público. No Brasil, não cumpre sua finalidade primordialmente educativa, que é obrigação, busca apenas o lucro. Qualquer fiscalização no intuito de coibir baixaria é logo tachada de “CENSURA”. O Estado se omite, e a mídia fica totalmente ao bel-prazer de empresas privadas. O escritor norte-americano Roger Shattuck (1923-2005) resumiu o descaso: Evitar que a pornografia chegue às crianças pela TV não é limitar a liberdade de expressão, é cuidar da saúde pública e da educação.

A televisão sexualiza a adolescência e escandaliza com a consequência. A meninada se cria assistindo a beijos de desentupir pia, vendo gente se escanchando ao meio-dia, quando faz neném, a própria televisão deita sensacionalismo em cima. Quer dizer, ganha dos dois lados. Tanto na teleaudiência da influência quanto na teleaudiência da consequência. Manchete: Menino de 13 anos engravida menina de 12 anos que dá à luz bebê de 7 meses.

Depois da Internet, a Televisão virou um radinho de pilha para mim. Sobretudo porque a Internet disponibiliza todo acervo cultural da humanidade para todo mortal. E eu não sou nenhum abestalhado para gastar todo o meu tempo ocupado com fuleiragem. Se você resolver endoidar, a internet o ajudará, mas se você quiser virar santo, ou sábio, a internet também o ajudará. Na Internet está o Bem e o Mal, só depende de sua formação educacional.

Sosígenes Bittencourt

Recordar é Viver – por Sosígenes Bittencourt.

Eu quero dedicar esse baú de lembranças às meninas que estão me aperreando por fotografias do tempo da brilhantina.

Eu estudei no Colégio Municipal 3 de Agosto, na década de 60. Fiz Curso de Admissão e fui o orador, por ocasião da entrega dos Diplomas do Curso Ginasial.

No Curso de Admissão, fui aluno das professoras Antonieta de Barros Lima, Zezé Lacerda, Glorinha Tavares e Carminha Monteiro. Eu parecia “gente”, estudioso e falante, tagarelava mais do que o Homem da Cobra. Tinha um medo do Bacharel Mário Bezerra da Silva que me pelava. Isso foi quando o Boletim Escolar era assinado em casa, e o Diretor podia botar menino de castigo, cheirando a parede, detrás da porta.

Sosígenes Bittencourt

Era do Silêncio – por Sosígenes Bittencourt.

Tudo que há de bom, em mim, é resultado da DISCIPLINA do meu tempo.
Sou da Era do Silêncio, quando tudo podia ser observado e sentido com paciência.
Sou do tempo em que havia tempo de acompanhar a réstia do sol
e contar estrelas.

Sou do tempo em que o coral dos grilos compunham a sonoplastia das estrelas.
Escola não era lugar de DISTRAÇÃO, era lugar de CONCENTRAÇÃO.

Sosígenes Bittencourt

O coração que ri – por Sosígenes Bittencourt.

O sofrimento é um prolongamento da dor, ele sobrevive à dor. Sofrimento é deixar de agradecer pelo amor recebido e resmungar pelo amor que deixou de receber.

Pessoas que amam a vida são pessoas que agradecem e, por isso, são pessoas calmas. A calma promove harmonia, porque a calma organiza a vida. E um dos benefícios dessa postura diante da vida é fundar no convívio a esperança.

O coração que ri não dá asas ao sofrimento porque palpita de esperança.

Sosígenes Bittencourt

Amor e Sexo – por Sosígenes Bittencourt

Há uma enorme confusão que se faz entre AMOR e SEXO. SEXO se pratica, AMOR se sente. SEXO é pessoal, AMOR é interpessoal. Ninguém faz AMOR, o que se faz é SEXO. Você pode praticar SEXO sozinho, mas não pode AMAR sozinho, ninguém ama ninguém, ama alguém. Você pode AMAR alguém que esteja em Londres, mas não pode praticar SEXO com alguém que esteja em Londres.

Sosígenes Bittencourt

No tempo de eu menino – Doce Japonês – por Sosígenes Bittencourt.

Uma vez minha mãe disse a minha irmã que comida de rua era porcaria. Quando o doce japonês passou na porta de casa, minha irmã pediu a minha mãe: – Mamãe, compra porcaria pra mim.

Comi muito as cocadas de dona Isabel, algodão de açúcar, pirulito, cavaco, chupei picolé de mangaba. Eu comia essas guloseimas populares, escondido, porque mamãe não queria que eu degustasse comida de rua. Foi quando aprendi que tudo que dá medo e é proibido excita o desejo.

Hoje, porcaria que eu conheço é comida industrializada e preservada na base do conservante. Tá ligado?

Sosígenes Bittencourt

Lenga-lenga entre Política e Economia – por Sosígenes Bittencourt.

Na realidade, é enorme a confusão que se faz, porque POLÍTICA e ECONOMIA são duas áreas distintas. A Política é uma invenção grega formidável para refletir a vontade dos homens, enquanto que a Economia passa ao largo da vontade dos homens – já nos esclarece o sociólogo Francisco Maria de Oliveira, fundador e, hoje, crítico do Partido dos Trabalhadores.

A Política deve corrigir as distorções da vida social. A Economia é o troço mais fluido do mundo, basta o coração balançar, o dinheiro vai pelo ralo. Senão riquezas milionárias não desabariam como um castelo de cartas. E como é que um Regime Político pode mandar em algo tão volátil?

A Política deve cobrar os impostos e destinar aos que não têm poder de competitividade. Depois, impedir que os que têm o poder de competir se entredevorem. Ninguém pode proibir alguém de enricar às custas do seu trabalho e de suas economias. Também não pode dividir o que foi conseguido com quem não conseguiu.

A Política pode e deve taxar as riquezas e injetar na miséria para extirpar este câncer social que não é natural, é produzido pelo homem. A função da Política é de uma importância ético-moral indiscutível e fundamental no desempenho deste papel.

Sosígenes Bittencourt

PADRE RENATO DA CUNHA CAVALCANTI – por Sosígenes Bittencourt.

Conheci padre Renato nos meus idos de menino. Havia meninos naquela época. Estudava na Escola Paroquial, sob a batuta maestrina de profª Luzinete Macedo. Bonita e asseada, educada e enérgica, explicativa, toda pedagógica. Foi lá que aprendi a conjugar o verbo AMAR.

Padre Renato era uma réstia de fé a deambular pela Igreja, uma espécie de souvenir de Roma. Em nossa mente de criança, parecia ter visto Jesus e conversado com Deus em oração. Sua figura nos remetia a reflexões sobre coisas transcendentais. Figurativas ainda, mas invisíveis mesmo assim.

Como nos sentíamos protegidos naquela época… O farfalhar dos coqueiros parecia uma conversa, e o coral dos grilos compunha a sonoplastia das estrelas. Vinha dos ensinamentos religiosos, nosso hábito de erguer a cabeça e ficar olhando para o céu. Não sei o que padre Renato vislumbrou em Vitória, mas sei que temos a glória de tê-lo como personagem de nossa história.

Requiescat in pace.

Sosígenes Bittencourt

Filho indesejado – por Sosígenes Bittencourt.

Em cima de filho indesejado, nada mais inútil do que chibata moral e desespero. Justamente porque filho não programado é geralmente fruto de emoção desenfreada, apetite incontido. O procedimento deve ser sempre a preservação da serenidade em busca da razão, embora tardia, para solucionar questões do passado. A vida ensina que no passado nem Deus põe a mão. O passado construído pelo homem é “vontade permissiva de Deus”.

Se filho indesejado é resultado de liberdade desenfreada, por que desespero para consertar loucura? Antigamente, quando um menino trelava excessivamente e fugia ao controle era chamado de “desesperado”. No dia em que “desespero” pagar compromisso, eu o aconselharei para sanar dívidas.

Logo, a primeira atitude racional deve ser identificar o pai da “arte”, uma vez que a mãe está à nossa frente com o fruto no ventre. Não adianta arrumar pai para menino e adiar uma questão que será um dramalhão no futuro. Essa questão de dizer que pai é quem cria é deslavada mentira. Pai é quem fecunda óvulo, quem cria é mantenedor. Agora, se o mantenedor é zeloso e ama o enteado, merece ser amado, é outro detalhe. Se o pai é um sem-vergonha de marca maior, e a mãe engravidou por distração carnal, não assumindo os seus atos, não merecem ser amados, o que nem sempre acontece. Merecer não é sinônimo de recebimento, gratidão. Às vezes, o sujeito cria o alheio e recebe pontapé no focinho. Em suma, a vida estará sempre acima de tudo. Todo expediente em favor da vida será bem-vindo, e todo expediente contrário à vida será pecado.

Ainda em relação à paternidade, em caso de dúvida, a ciência entrará com o DNA, ninguém merece não saber quem é o seu pai, mesmo que o reprodutor não seja um anjo. Mentira tem pernas curtas e as más-línguas irão fuxicar. Portanto, é momento de buscar a razão, que não foi convidada no instante do desespero. Razão é reflexão, e reflexão é mais lenta que emoção, precisa de serenidade. Desespero é emoção, que, por associação, deve ser evitado. E, para não resvalar para o discurso moralista, a chibata moral, que de nada serve nesse instante, o conselho é o seguinte: Sexo é a coisa mais gostosa do mundo, mas fazer menino não tem nada a ver com isso. Haja vista que masturbação não gera coisa alguma e a macacada pratica desde a grande descoberta. Filho é vida, é universo, é criação, tem de ser programado, fruto do amor, que é racional. Quando for fazer sexo para sentir prazer, faça a munganga, não faça menino, ninguém é mais ingênuo como antigamente, não estamos mais na era da cegonha. Use a liberdade, preservando a devida segurança. Afinal, segurança sem liberdade é escravidão, mas liberdade sem segurança é loucura.

Sosígenes Bittencourt