A Sudene e o seu valioso acervo cultural numa data histórica – por Marcus Prado.

Há os que passam pelo imponente e histórico prédio da antiga sede da  Sudene,  Superintendência do Desenvolvimento do Nordeste, e  sentem uma  agonia nas veias da alma, os que se recordam da Sudene de um tempo  heroico não muito distante e dão com os olhos  no prédio em  quase desuso,  ao lembrar que nesse conjunto de paredes e centenas de salas  esvaziadas após cinematográficos  escândalos, o colosso de 269 metros considerado expoente da arquitetura moderna, a antiga autarquia vinculada diretamente à Presidência da República, deixou de cumprir a  missão de promover o desenvolvimento socioeconômico do Nordeste.

Quem passa por essa imensa gaiola que parece uma serpente de tijolos solta no ar não tem como deixar de sentir, se conhece a sua história, a presença de Celso Furtado, que honrou como nenhum outro intelectual o pensamento econômico brasileiro e inspirou gerações de economistas e demais cientistas sociais. Junto com a sua equipe, o que havia de melhor na Região em planejamento econômico e social, somada ao que produzia em pesquisa social a Fundação Joaquim Nabuco, que sempre marcou presença de parceria com a autarquia federal, Celso Furtado compreendia que a integração nacional só seria concretizada com a redução das desigualdades estruturais entre as regiões do país. Eis o ideário de Celso Furtado, ele que era conhecido dentro e fora do Brasil como “ a esperança militante”. O sonho acabou com dolorosas perdas depois do golpe de 1964, com prisões, exílios, humilhantes perseguições. Foi daí que começou o seu desmonte, fez com que a Sudene abdicasse das preocupações reais para as quais fora incumbida de resolver.

Criada há 62 anos pelo presidente Juscelino Kubitscheck, quero celebrar com uma boa notícia. Ainda resta um tesouro a ser preservado, a sua memória, o seu acervo de grande importância documental, a biblioteca criada pelo Decreto nº 48.530 em 1960, recebendo o nome de Biblioteca Celso Furtado em homenagem ao seu idealizador e primeiro superintendente da autarquia, tendo como finalidade preservar a memória institucional da Casa. Uma missão a ser cumprida por seu atual superintendente, o general Araújo Lima.

O que existia de documentação, tudo indica, está preservado, aberto ao público, agora em novo endereço: Av. Eng. Domingos Ferreira, 1967 – Boa Viagem, Recife. A começar pela Biblioteca Celso Furtado, uma das mais ricas do Brasil, responsável pela normalização, controle, seleção, processamento, armazenamento e disseminação das informações bibliográficas de documentos produzidos pela instituição, desde o começo, portanto, merecedora de adequada proteção, posto que ajuda a preservar a memória da instituição e da própria região Nordeste. Suas obras subsidiam o planejamento para o desenvolvimento da região e servem de base para trabalhos e pesquisas. A maior parte do público é de pesquisadores e estudantes de graduação e pós-graduação.

O acervo é formado pelas coleções: Coleção Sudene. É a coleção principal da Biblioteca, composta por toda a produção bibliográfica da instituição, assim como documentos técnicos/científicos elaborados e/ou publicados pela Sudene. São documentos de valor histórico, científico e cultural inestimável. Cartas Topográficas do Nordeste: A mapoteca, talvez a mais rica do Brasil, de incomparável importância documental, é formada por cerca de 600 cartas elaboradas em convênio com entidades especializadas. A coleção de cartas topográficas na escala de 1:100.000 abrange todos os estados do Nordeste e partes de Minas e Espírito Santo e a coleção de cartas topográficas na escala de 1:25.000 abrange partes da Paraíba, Pernambuco e Alagoas. É atualmente a coleção mais consultada da biblioteca. Muito pesquisada por cartógrafos, geógrafos, geólogos, urbanistas, professores e estudantes, além de escritórios de engenharia não só do Brasil.  Segue-se o acervo do Condel: O acervo do Conselho Deliberativo da Sudene é composto por 5 tipos de documentos: atas, pareceres, proposições, resoluções e relatórios. Toda a documentação textual referente aos anos de 1959-2000 está digitalizada e pode ser consultada on-line através do site http://procondel.sudene.gov.br/. Nesse mesmo site é possível encontrar um breve resumo sobre o que é o Condel.

Ouso dizer que não se escreve a história política e econômica do Brasil dos nossos dias sem passar pelos arquivos do Condel, assim como pelos arquivos do Cehibra/Fundaj, com uma riqueza de incalculável abrangência. Os documentos originais encontram-se preservados na Biblioteca e também podem ser consultados de forma presencial por pesquisadores e demais interessados. O acervo Condel conta ainda com fotografias, fitas de áudio e vídeo. Coleção Celso Furtado: Obras de autoria de Celso Furtado, algumas foram doados por ele à biblioteca. Inclui também trabalhos feitos sobre a obra de Celso Furtado, além de periódicos como Revista de La Cepal e Cadernos do Desenvolvimento.

Ainda sobre o edifício da Sudene, cabe um apelo à Universidade Federal de Pernambuco, atual gestora do gigantesco imóvel, para a preservação de outro patrimônio cultural:  a cerâmica artesanal confeccionada por Francisco Brennand e o jardim idealizado pelo paisagista de origem pernambucana, Roberto Burle Marx. Por fim, a antiga sede da instituição representa um conjunto moderno de edifício e jardim, implantado em 1972, que reúne atributos para ser protegido como patrimônio arquitetônico moderno de Pernambuco. A cidade do Recife conta com um conjunto significativo de jardins públicos e privados projetados por Burle Marx, alguns são protegidos pelas instâncias federal, estadual e municipal, mas o da Sudene, sendo um dos mais belos e objeto de trabalhos acadêmicos, tem sofrido pela descontinuidade administrativa da autarquia especial.

Marcus Prado – Jornalista

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