Flávio José apenas expôs o desmonte em curso……

Em recente acontecimento, ocorrido no palco do Parque do Povo, na cidade paraibana de Campina Grande, em que o renomado cantor nordestino,  Flávio José,  confirmou  o encurtamento do tempo do seu show em detrimento ao alongamento da apresentação da  atração musical seguinte –   um artista estranho à gênesis do forró –  apenas ratifica o que vem acontecendo  há várias décadas, ou seja:  o desmonte silencioso em curso da nossa principal e mais popular manifestação cultural.

Os festejos juninos, evento religioso e profano num só tempo, é uma espécie de perpetuação da satisfação do povo nordestino em comemoração à chegada das chuvas invernosas, no sentido da perspectiva da boa colheita e de um alento à seca que sempre castigou a região. Fé aos santos do mês de junho e o apego inegociável às suas raízes foram, por assim dizer, os principais ingredientes da construção, ao longo de tempo,  dessa mais pura manifestação popular chamada São João do Nordeste.

Diz o ditado: “ não se deve fazer cama para os outros deitar”. As nossas festas juninas viraram um grande negócio. Desfigura-las no contexto musical, dando espaço avantajado e sequenciado aos grupos de pagode, ao axé, às voláteis duplas sertanejas e até ao alienígena som eletrônico é simplesmente  sepultar os artistas regionais. É deixá-los, apenas, como moldura de uma obra em que os mesmos já foram protagonistas  em todos os seus quadrantes.

E o  pior dessa verdadeira inversão de valores, vale sublinhar, é que os artistas do lado rico do País (Sudeste e Centro-Oeste) que estão se apresentando no São João do Nordeste, além de muito dinheiro,  estão ampliando  exponencialmente seus horizontes artísticos justamente no lado empobrecido do País  financiados, ironicamente,  pelos pacos recursos públicos que deveriam alavancar a cultura nordestina. Ou seja:  além de “roubar” a cena musical e subtrair o quinhão financeiro dedicados à cultura nordestina estancam, de maneira impiedosa,  o processo de renovação  dos novos talentos que estão  brotando na região do Rei do Baião.

No meu modesto entendimento, certamente há de haver um grande movimento sincronizado por trás de toda essa megaestrutura, possivelmente “lubrificado” pelo lamaçal da sempre vantajosa corrupção,  perpetrado pelos senhores políticos, diga-se: boa parte dos governadores e dos prefeitos da Região do Nordeste.

Basta observar, por exemplo, a grade de apresentação para “suas majestades de fora”, isto é:  são milimetricamente pensadas  para o encaixe nos programas de televisão,  produzindo assim vantagens de toda ordem financeira. Racional seria se toda essa “ginástica logística” fosse para produzir e projetar,  ao grande público nacional,  os festejos locais (regionais) e, em ato contínuo,  os  verdadeiros artistas e “donos” da programação  junina. Diga-se: as atrações musicais nordestinas!

Pois bem, na música composta por João Silva e J.B. Aquino, gravada, entre outros, pelo Trio Nordestino, Luiz Gonzaga e Elba Ramalho,  intitulada de “Pic Plic Plá”, a mesma, ao seu tempo, vislumbrava um futuro privilegiado para o forró, dizendo: “ele veio do fundo dos quintais, hoje é maioral dos palhações, tá valendo milhões….Tá valendo milhões…..O forró tá valendo milhões…..”

O tempo passou….  E como a vida é dinâmica e muita vezes o sistema é perverso, os milhões que deveriam ser investidos no  forró para  alimentar, no bom sentido da palavra,  os artistas que  fizeram de suas respectivas vidas um verdadeiro sacerdócio à música genuína da sua região, infelizmente, são “cancelados” no seu próprio terreiro (São João). Portanto, ao mesmo tempo, no sentido figurado e real, lembremos do poeta Flávio Leandro:  “Eu não quero enchentes de caridades. Só quero chuvas de honestidade…………..” Viva o São João do Nordeste!!!

 

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *