A Pedra do Reino e o início do seu tombamento.

Era meu desejo encerrar o meu mandato de conselheiro do Conselho Estadual de Preservação do Patrimônio Histórico de Pernambuco, na terça-feira, 23 de dezembro, pedindo a abertura protocolar do processo de tombamento do sítio histórico da Pedra do Reino, localizado na zona rural de São José do Belmonte, um cenário emblemático que enriqueceu a ficção magistral de Ariano Suassuna, com o seu Romance d’a Pedra do Reino e o Príncipe do Sangue do Vai-e-Volta, um dos mais celebrados da literatura de língua portuguesa dos nossos dias.

O colegiado, reunido na sede do Conselho – Casa de Oliveira Lima – ouviu atentamente as razões descritas na minha proposta de abertura do processo e o aprovou, por unanimidade. Reconheceu como incontestáveis as minhas alegações. Para produzir o meu parecer, realizei pesquisas de campo e documentação fotográfica, que resultou em mais de 800 fotos a serem doadas à Fundarpe e ao Conselho Estadual de Preservação do Patrimônio Histórico de Pernambuco.  Agora, segue para tramitação de praxe a cargo do corpo técnico da Fundarpe, passando pelo instituto jurídico da instituição governamental, que formatará a parte conclusiva do pedido, suas exigências e recomendações, tanto da parte do governo, que fará sua homologação, como dos proprietários do sítio histórico. A primeira exigência é que a proteção do bem tombado terá de ser compartilhada com a autoridade governamental e com a população, para que, no futuro, não haja prejuízos irreparáveis como ocorre neste país, por causa da inércia dos poderes públicos e da ignorância, da negligência e da cobiça dos particulares.

Era desejo de Ariano, segundo conversa comigo, que o pedido de tombamento só fosse formalizado depois que se desse por concluída a instalação das 16 esculturas gigantes, dispostas em círculos, dos santos e personagens do episódio sebastianista que inspirou o seu Romance. Para ele, as 16 esculturas faziam parte do imaginário armorial, reconhecendo a forte herança que nos transmite, o sítio histórico, de um passado pernambucano, suas lendas, superstições e mitos remanescentes do período medieval.

O parque das esculturas – parte integrante do tombamento, foi concluído, o cenário está pronto.  A história, na voz de Ariano, nos fala do desaparecimento misterioso do rei de Portugal, Dom Sebastião, no século 16, durante a batalha de Alcácer-Quibir, no Marrocos. “Gerou muita expectativa nas pessoas de que ele havia sido arrebatado, encantado por feitiço, e que um dia retornaria para trazer a paz e a prosperidade ao seu povo. Movido por essa crença, no século 19, no sertão de Pernambuco, João Antônio dos Santos disse que teria sonhado com o rei português encantado entre os dois rochedos da Serra do Catolé”.

Pela sua monumentalidade histórica e paisagística, pode representar um dos pontos de maior relevo de atração não meramente turística, até mesmo teatral, pelo que inspira e convida. Nesse sentido, pode transformar-se num filão expressivo, como o foi, e tem sido, a experiência teatral de Fazenda Nova, com o espetáculo da Paixão de Cristo, restando congregar, positivamente, os diversos agentes culturais envolvidos na política de preservação e promoção do nosso patrimônio. Creio na garra empreendedora de Gilberto Freyre Neto (Secult) e de Marcelo Canuto (Fundarpe), no esforço que terão em criar um novo polo cultural em São José do Belmonte, inspirados na Pedra do Reino. As possibilidade desse sítio histórico, a partir do sonho de Ariano Suassuna, são inquestionáveis, não limitadas, apenas, às cavalhadas anuais, que podem ser, aliás, um bom instrumento articulador e colaborador de educação patrimonial. Sem educação patrimonial, não existe tombamento.

Marcus Prado – jornalista.

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