
A MORTE DO DONO DA FUNERÁRIA
(O PAPA DEFUNTO)
Lá na minha pequena cidade natal, no interior de Pernambuco, o povo sofria muito com as dificuldades da vida, pois não havia grandes empresas comerciais nem industriais, a população vivia da dependência da produção agrícola dos pequenos sitiantes. Como conseqüência da falta de empregos para a mão de obra jovem, àqueles rapazes e moças mudavam para outras cidades maiores em busca de trabalho e de melhora nas condições de vida. Isso era fato corriqueiro em quase todas as famílias da cidade.
Com a família do seu José, esposo de dona Maria e pai de quatro filhos- José, João, Antonio e Maria- não era diferente. Ao chegar à idade de buscar emprego, os irmãos se mudaram para São Paulo levando em suas bagagens pouca experiência e muita esperança.
Seu José era dono de uma pequena bodega, onde negociava vendendo poucas coisas, tais como, querosene, sal, farinha, sabão em barra, óleo, carne de charque, bolachas e outras coisinhas, negócio sem muita lucratividade não lhe permitindo ter condições de criar e manter aqueles filhos dentro de casa. Assim, apesar do choro e da saudade dos meninos permitiu que fossem procurar uma melhora de vida noutro lugar mais desenvolvido, por isso foram parar em São Paulo.
Os irmãos mais velhos, José e João, já acostumados com a lide do trabalho na roça, eram fortões e musculosos e logo que chegaram a São Paulo foram trabalhar como serventes de pedreiros na construção civil e nas folgas e feriados começaram a treinar lutas marciais numa academia próxima de casa, tornando-se, após um tempo, grandes e famosos lutadores do MMA. A irmã Maria arranjou um emprego de vendedora de loja, logo se casou com o gerente da loja. Já o irmão Antonio também se arrumou e trabalha como cobrador de ônibus.
O tempo passou e seu José ficou muito doente. Cidade sem médico e doença difícil de curar. Dona Maria providenciava todos os tipos de chás, garrafadas e todas as mezinhas que lhes ensinavam e nada de seu José melhorar. Foi parar na cama, já não andava e nem queria comer. A enfermeira do posto de saúde, que tinha a fama de muito fofoqueira, diariamente ia à casa do doente e lhe aplicava injeção e nada do seu José melhorar. A notícia caiu nos ouvidos do povo da cidade dizendo que seu José estava morrendo. A enfermeira jurava que não tinha sido ela a divulgadora de tão triste notícia, apesar do Sr. Jorge Martírio, mais conhecido como PAPA, dono da única funerária da cidade ser primo legítimo da enfermeira.
Após a divulgação daquela notícia o seu PAPA passou a ir, diariamente, duas vezes na casa do seu José, saber notícias do estado de saúde do doente:
Primeiro dia:
– Papa: bom dia dona Maria, com está seu marido?
– Esposa: bom dia seu Papa, ele está na mesma situação
– Papa: boa tarde dona Maria, seu José como está?
– Esposa: boa tarde seu Papa, tudo igual, nenhuma melhora.
Segundo dia:
– Papa: bom dia dona Maria e aí como está o doente?
– Esposa: só a graça de Deus sabe.
– Papa: boa tarde dona Maria tem notícia boa para mim?
– Esposa: sim, ele deu uma melhorada hoje.
– Papa murmurando: notícia boa nada. Horrível, estou precisando vender um caixão.
Terceiro dia:
– Papa: Bom dia dona Maria o homem ainda está vivo?
– Esposa: claro que está vivo, graças s Deus.
– Papa: dona Maria a senhora me permite que eu entre até o quarto do defunto, digo do meu cliente para tirar as medidas dele para ir adiantando a confecção do caixão?
– Esposa: o Senhor é doido? Claro que não, meu marido está vivo.
– Papa: está vivo por pouco tempo, logo vai precisar do caixão e eu vou ter que fazer as pressas, isso fica mais caro para a família do defunto e a senhora já podia ganhar esse desconto.
– Esposa: credo em cruz seu Papa, vá embora pelo amor de Deus. Entrou em casa chorando.
Quarto dia:
– Papa: bom dia dona Maria, o homem ainda está vivo? Ele é muito forte, heim?
– Esposa: graças a Deus está vivo e melhorando.
– Papa: dona Maria a senhora sabe por que eu sou conhecido por PAPA?
– Esposa: claro que não! Não conheço a sua vida.
– Papa falando: pois é, sendo eu o dono da funerária da cidade, tenho muita experiência com doentes e sei quando a pessoa vai morrer ou vai escapar. Por isso que o povo me chama de PAPA DEFUNTO. Eu tenho certeza que seu José vai morrer logo e sem demora.
– Esposa: homem vá embora pelo amor de Deus, entrou chorando.
Passou mais uma semana e aquela situação não mudava. O PAPA defunto continuava indo à casa de seu José diariamente, para perguntar a velha senhora se o marido já havia morrido: gritava lá do portão: dona Maria o homem já morreu? …..Ainda não!!!?….. Puxa vida, este véio é duro na queda,……. Nada ainda? …..
Certo dia, o PAPA defunto gritou lá do portão: dona Maria aqui é o PAPA, me dê uma boa notícia, hoje.
– dona Maria apareceu chorando ao portão, seguida pelos dois filhos, José e João, LUTADORES DE MMA, que se dirigindo ao PAPA DEFUNTO lhe disseram: nós vamos arranjar um defunto para tua funerária e em seguida deram uma boa surra no PAPA DEFUNTO.
Em seguida os irmãos providenciaram a mudança dos pais para São Paulo e o PAPA DEFUNTO ficou no morre/não/morre no posto de saúde e não tinha nem um caixão de defunto pronto para ele.
Adelson Cardoso Escritor bissexto abril/2022.
