BOA VIAGEM…

Na noite de ontem (13) fiz uma viagem. Mesmo sem nunca ter chegado, de fato, ao destino gostaria de compartilhar com vocês, internautas do blog do Pilako, à possibilidade de também fazê-la. Sendo assim, então, sugiro a leitura do texto abaixo, confeccionado pelo meu avô Célio Meira.

Louvo, hoje, a sua memória. E faço, creio, em nome das criaturas que a amaram, no berço nativo.

AS DANÇAS NO CHALÉ – Há cinquenta anos, na Vitória de Santo Antão, as dansas do Chalé do coronel Austriclínio Pais Barreto, ex-militar no Amazonas e em Pernambuco, advogado e jornalista, – eram excelentes e famosas.

Nos três dias de carnaval, nas festas rumorosas de Santo Antonio, São João e São Pedro, e em a noite de Natal, misteriosa e cristã, dançava-se animadamente, até que os galos, amiudando o canto, anunciavam a madrugada. Às vezes, porém, rodopiava-se na “valsa da madrugada”, até aos minutos finais em que, no céu, aparecesse, suave e indecisa, a luz do amanhecer.

A magistratura – o juiz de direito, o juiz municipal e o promotor de justiça comparecia a essas festas inesquecíveis.

Estava presente, de farda ou de jaquetão, o delegado de polícia.

Confraternizavam, na taça de champagne, ou no copo de cerveja, políticos da oposição e do governo. Não faltava a imprensa.

Reunia-se no chalé hospitaleiro a fina flor da sociedade fidalga e benemérita de minha terra natal. Iam a esses encontros festivos de amizade famílias do Recife.

O casal Austriclínio e Dona Bela era amável e generoso. E as filhas, moças do meu tempo de rapaz – Carmen, Eulina, Iaiá, Belinha, Dalila e Leonor – faziam, a dançar e a tocar piano, o encanto desses bailes familiares, e memoráveis, em que, á meia noite, obrigatoriamente, com as mesuras dos dansarinos e as exigências dos costumes, se dançava a quadrilha aristocrática. O par marcante, quase sempre, era o coronel Austriclínio, elegante e formalista, de acordo com os estilos.

Em as noites de carnaval, dançando-se a valsa romântica, o schottisch”, a mazurca, a polca pulada ou a polca de roda, jogava-se confeti e usava-se a bisnaga de água perfumada. E nos festejos juninos, interrompia-se a dança, de vez em quando, a fim de que os pares, risonhos e ofegantes, assistissem a uma “Batalha” de buscapés travada na rua, ao queima de um “craveiro” ou à subida de balão de listras coloridas, acompanhada com foguetes.

De quando em quando, depois de meio século, ao passar pela calçado do velho chalé, detenho o passo e, aproximando-me do gradil, espio a fachada da mesma cor antiga, canteiros e jardim e terraços solitários. A paiságem quase a mesma. Lembro-me então, dos vivos e dos mortos. Recordo-me de episódios, de amizades que não se desfizeram com as mudanças do tempo, e, de namoros que se transformaram em noivados e em casamentos. Meus olhos não veêm pares de outras eras; meus ouvidos não percebem compassos das valsas de Ernesto Vieira e de Alfredo Gama; mas, meu coração escuta, vindas de longe, do mundo invisível e harmonioso das lembranças, melodias do passado.

(REVISTA DO INSTITUTO HISTÓRICO DA VITÓRIA DE SANTO ANTÃO – VOL III – 1982 – pag. 24 e 25)

Dr. Célio Meira (Escritor)

2 pensou em “BOA VIAGEM…

  1. Querido Pilako que bom, mas que bom mesmo poder ler um texto deste naipe, tão valorosamente saudosista.
    Que bom saber que nesta terra de Mariana Amália homens pensavam como seu Avô: com amor e saudade!
    Eu, particularmente, não confio em homens sem passado, e seu Avô, pelo visto tinha passado, mas passado amado e sempre revivido!
    Não sei se a palavra certa é essa: parabéns pelo texto, e muito mais pelo Avô que sonhava, vivia e amava o passado bem família!!

  2. Pingback: Internauta Manoel Carlos comenta em matéria | Blog do Pilako

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